Nelson Gonçalves: O REI DO RÁDIO

O Jornal do Comércio do Ceará presta significativa, homenagem ao cantor Nelson Gonçalves, “O Rei do Rádio”, que se vivo fosse, estaria completando nesse mês de junho cem anos de existência. O Jornal do Comércio do Ceará brinda seus leitores com esta reportagem especial.

 

(Por Stella Miranda)

Praticamente o último remanescente da velha escola de cantores tipo dó-de-peito, deveria, portanto, ser tombado como monumento espiritual da cultura nacional. O Rei do Rádio é um patrimônio recheado de equívocos históricos imperdoáveis. Ganhador do Prêmio Nipper (Nipper é aquele cãozinho famoso, que fica ao lado do gramofone no selo da RCA) da indústria fonográfica internacional – honraria antes só concedida a Elvis Presley – pelo tempo de permanência recorde na mesma gravadora (à época, 33 anos; hoje perfazendo um total de 55 anos), Nelson impressiona pelos números. Ao longo de cinco décadas, gravou mais de 2.000 canções registradas 183 discos 78 rpm, um número incalculável de compactos (em torno de 100), mais de 200 fitas e 127 LPs gravados, segundo os cálculos do próprio Nelson. Com 53 milhões de cópias vendidas, recebeu 15 discos de platina e 41 de ouro. A gravadora não confirma todos esses dados. O número de LPs, por exemplo, não passaria de 98; mas, incluindo aí os Lps gravados e as seleções de ouro ou as gravações, ou mesmo o LP Saudade que maltrata, do selo Revivendo, de Curitiba (1989), constatamos que a famosa lista oficial é passível de várias interpretações. Daí o eufemismo do campeão. Enfim, como dizia um célebre filósofo francês, “a glória de um homem é a mistura de verdades e mal entendimentos ditos ao seu respeito”. Que assim seja. “Sou uma espécie de dinossauro”, pontifica com ironia majestática o Rei, debaixo de seus 76 anos de idade.

Ao lado de Orlando Silva e Francisco Alves, fez parte durante cinco décadas, da trindade soberana dos cantores do rádio. Nelson, porém, atropelado pela modernidade, não enterrou a glória entre os decrépitos conjugados de Copacabana, como tantos esquecidos ídolos nacionais. Não. Ao contrário, aos 70 anos, grava um disco antológico ao lado do roqueiro Lobão, Milton Nascimento e chico Buarque. O Rei do Rádio prestou contas à contemporaneidade. Nelson incorpora na estética fashion, o chique-Kitch da boa e velha dor-de-corno tão cara aos brasileiros, da barra-pesada, anéis de brilhante, dos rende-vous de abat-jourslilás, das gafieiras e boleros de subúrbio. Viciado e ex-presidiário, dizem que tomou onze tiros no corpo e acertou mais de cinquenta. Será?

Cabelo gumex, paletó apertado e salto carrapeta, o malandro passou fome nas pedras do aterro do flamengo e frequentou os lupanares do submundo na Lapa de Madame Satã. Criou dez filhos, entre adotados e legítimos. O Frank Sinatra brasileiro sempre foi um paradoxo; machista convicto, Nelson Gonçalves é hoje a reserva moral da MPB.

A genialidade furiosa do nosso carusinho do Brás, é uma ópera viva como nas melhores páginas do outro Nelson, o Rodrigues, dramaturgo. Vejamos: para livrar-se de tanta desgraça, nosso herói organiza uma antológica luta de boxe contra o campeão mundial dos pesos-galo Eder Jofre. O estádio repleto. No sétimo round, Metralha já desfigurado vai a lona, mas não é nocauteado. Levanta-se cambaleante. A platéia em delírio pede mais. O cantor ensanguentado retira as luvas, ergue os braços, solta o vozeirão e canta, em êxtase, Castigo, de Lupicínio Rodrigues. É ou não é Nelson Rodrigues puro? Ou esteticamente outro Mário de Andrade que o Antunes Filho houvesse traduzido: o herói viaja em turnê para cantar em Rondônia. Seu aviãozinho bimotor pousa numa pista clandestina e lá, para receber Metralha num cerimonial de boas-vindas, a tribo de índios guajarás-mirins dança o ritual poético: todos nus com o LP de Nelson de baixo do braço… hop hophophop! É ou não é Macunaíma revistado?

O tema da brasilidade, da identidade nacional, era um tema que estava fora de ordem e que, não é à toa, está voltando ao debate nacional. Os mitos habitam o inconsciente folhetinesco como herança cultural, fortalecendo nossas referências e tramando nossa memória coletiva. Ora, a narrativa dos tempos fabulosos de um herói da mitologia brasileira como Metralha, serve como um farol para nos alumiar, como dizia Mario de Andrade: se genial, indicando o caminho a seguir; bestial, naufrágios por evitar. O Brasil vive procurando a si mesmo. Achou. Carmem Miranda, Orlando Silva e agora Nelson Gonçalves, assentam-se definitivamente no panteão musical dos heróis nacionais. Podemos nos vangloriar desses ídolos, reafirmando, como Ruy Castro, que “não há ai nem um pingo de ufanismo”. É ver para crer; pois, refletindo nesses espelhos magistrais, está nosso orgulho de ser brasileiro.

A recuperação histórica do mito Nelson Gonçalves começa aqui. Hoje, Metralha pode afinal vir à tona, pois jazia abandonado no emaranhado felpudo da cultura nacional. E por que? Talvez porque o rei do Rádio tenha vivido ele mesmo, como apontou o crítico Tárik de Souza, “turbulências periódicas e tramas pessoais tão intrincadas, que superaram em muito os dramas passionais do seu repertório”. Uma coleção de perturbadores personagens anônimos, assustadoramente reais, habitam a boemia e desfilam pelos tangos, foxes e boleros do cantor: a Odalisca, a Normalista, a Lili Analfabeta, a Flor do meu Bairro, a Cruz da Desilusão, Acabou-se o Confete, Pecado Ambulante, Figura Mignon, Doidivana, Pepita, Sapoti…

Transcendendo o histórico particular do cantor, essas 71 faixas garimpadas ilustram, nós não diríamos o universal, mas o arquétipo nacional de um (macho) brasileiro. A MPB ainda não havia prestado a devida homenagem à sua mais perfeita tradução  que, quando canta, rasga a garganta e se transforma em rouxinol: Nelson Gonçalves, o Super-Homem Brasileiro.

 

São Paulo, Carnaval Modernista de 1926.

Estamos no Brás, bairro paulistano em pleno rush industrial. O Brás, Bexiga, Barra Funda, Pari, Moóca e Belenzinho eram bairros de gente humilde com uma vida popular interessantíssima, onde brasileiros brancos, negros e mestiços, em pleno reduto de imigrantes italianos e outros povos da Europa, misturavam-se na confusão pitoresca dos cortiços que surgiam nesses bairros proletários. Era lá que vivia a família do nosso herói.

Era uma vez um gaguinho, Tonico. Caçula dos dois irmãos, tinha 6 aninhos e um timbre aveludado. Cantava nas feiras-livres, trepado num caixote de bacalhau, enquanto o pai, seu Manuel, artista mambembe e violonista esperto, se fingia de ceguinho para arranjar alguns trocados. Quincas, o primogênito, era passador oficial da caneca e a mãe, D. Libânia, cachopinha de Viseu, rodopiava em torno deles apregoando seu Libreto de modinhas. Está montado o circo. Em cena, a família Gonçalves.

Seu Manuel e D. Libânia eram imigrantes portugueses que desembarcaram no Rio de Janeiro, no fim da Primeira Guerra, passando pelo Rio Grande do Sul, antes de se fixarem na Paulicéia, precisamente neste bairro de gente humilde. O carusinho do Brás nasceu nos pampas por acaso, em 21 de junho de 1919, em Santana do Livramento, fronteira com o Uruguai. “Quando de lá saímos e pra cá viemos, meu miúdo tinha só 6 dias, o pobrezinho”, teria dito D. Libânia.  “E agora cá estamos em São Paulo, o pai, a mãe e os putinhos; vamos fazer deste Brasil um imenso Portugal”, responderia seu Manuel, aquele que tinha vista curta para arrumar emprego.

Na conjuntura socioeconômica, a revolução de 30 sacudia o país. A crise mundial do capitalismo, deflagrada pela depressão de 1929, repercutiria na estrutura da sociedade. Enquanto isso, os Gonçalves iam levando a vida como donos de bar. Cinco anos haviam passado. Seu Manuel alista-se no Exército Constitucionalista, bota o uniforme no prego e com a grana, paga bebida para toda rapaziada do Brás. Quem é do Brás não é brasileiro?

O núcleo familiar e social dos Gonçalves forjou parte do caráter, da ginga e do jogo de cintura do nosso carusinho. Aos doze anos, Antonio Gonçalves (Tonico), havia aprendido a encarar a vida de um modo muito peculiar.

O apelido de Metralha – alcunha já merecida de batismo por honra e excelências do menino, mas só creditada já nos anos de maturidade pelo violonista Dino – era devido à gagueira do coitadinho. O moleque falava depressa demais, cuspindo as palavras; tanto que acabou sendo expulso do Liceu Eduardo Prado, no quarto ano primário, quando num engasgagato mais animado, atira o tinteiro nas costas da professora. Ora, os pais educavam os miúdos sob os modernos métodos da educação experimental. Tonico foi então ser jornaleiro na vida, engraxate, mecânico, polidor e tamanqueiro. Trinta anos depois, fez o Artigo 91, equivalente ao ginásio, e aos 45 anos de idade, completa o Artigo 99, que é o cientifico.

Numa pelada de várzea na Moóca, leva uma tremenda surra do colega Venâncio Fernandes, aluno de boxe do Belenzinho (que mais tarde entraria para a Força de Choque da Polícia Especial de Getúlio). Depois de ter a Veneziana arrastada pelo chão, Tonico decide que vai ser boxxeur na vida e muda-se para Taubaté. Lá, aos dezessete anos, Antonio Gonçalves Sobral, vulgo Metralha, com 4 anos de academia, vence 24 adversários, obtém dez vitórias por nocaute e perde só duas vezes, por pontos. Recebeu, então, a faixa de Campeão Paulista dos Meio-Médios. Prêmio pela vitória: vinte contos de réis. Era uma merreca. Não dava pé. Só mesmo estudando música com o mestre Armando Bellardi. Passados seis anos de canto acadêmico, o maestro Bellardi dá uma decisão: cantor ou bouxer? Foi ser cantor de gogó, é claro. Aprendi tudo: respiração, divisão das palavras, valorização das tônicas. Não cansava as cordas vocais, respirava pelo diafragma, dava até dó-de-peito e o seu famoso ré gravíssimo. Foi ainda o maestro Bellardi quem explicou para o caçula de D. Libânia, que ele não era gago; era taquilárico, do grego takimós: respiração curta, acelerada. E o mestre deu então o brado retumbante: Vox Populi andate a cantare, vai cantar pro povo, meu filho!

Só que esse nome, Antonio, não era nada sonoro e a rapaziada do Brás escolheu outro: Nelson. É, Nelson era muito mais musical. O rapazote era, estão, a ansiedade típica da juventude pobre do bairro. Sua amiga Sônia Carvalho, a flor do meu bairro, leva o rouxinol para um teste na Rádio São Paulo com o maestro Gabriel Migliori. O rapaz pede para cantar Chora Cavaquinho, de Mestre Dunga, o grande sucesso de Orlando Silva. Como seria possível? Pois foi aprovado e a estreia marcada no programa Teatro Alegre, do humorista Tom Bill. Aurélio Campos, futuro deputado federal, à época locutor da rádio, fez as apresentações e Tom a introdução, ao vivo, do estreante Nelson Gonçalves. Mauro na flauta e Rago no violão. O regional ataca. Nelson mudo, paralisado diante do microfone. O regional introduz novamente. Nelson emudecido de nervosismo; a voz não sai. Uma terceira vez, e nada. Tom Bill explode: Aí, malandro! Cantando pra dentro? Com vocês ouvintes, o cantor-mudinho. Um fracasso. Entrou mudo e saiu calado. Na semana seguinte já era uma piada. Vamos ver se desta vez sai! Será? Pois saiu, sim, de ponta a ponta. Esse Tonico era porreta mesmo. Deu a volta por cima e, todo vedete, soltou o ré gravíssimo e cantou como um rouxinol…

O futuro batia às costas do carusinho, mas o destino e a guerra bateram à porta na cara dele. Devido à crise, a PRA-5 promove cortes em massa no seu pessoal. Músicos e cantores românticos estão despedidos. Nelson está no olho da rua. Dois anos contratado, dois anos de casado e já desempregado. Verdade. Nesse intervalo ele casara-se com D. Elvira Molla e tivera dois filhos: Marilene e Nelsinho. Na rua da amargura, pede emprestado alguns trocados e, apesar das ondas curtas paulistanas nunca alcançarem as de outros estados, parte para a Cidade Maravilhosa. Quem é do Brás, não é brasileiro? Sua bagagem: uma bisnaga, 3 ovos cozidos e um guarda-chuva. Foi precavido, pois temporais o aguardavam.

Em 1939, começou querendo cantar parecido com Orlando Silva. Como disse o crítico J.R. Tinhorão, “seu timbre naquela época arrastava inapelavelmente para a imitação de Orlando. E o resultado desse seu equívoco foi um recorde de reprovações”. Nelson fez sua peregrinação pelos programas de calouros das rádios cariocas e foi reprovado em todos os testes: por Celso Guimarães (da Rádio Nacional), Carlos Frias (da Rádio Tupi), Cezar Ladeira (da Rádio Mayrink Veiga), Renato Murce (da Rádio Clube), pelo Claudionor do regional e por Ary Barroso (da Rádio Transmissora), que sugeriu que ele voltasse a ser garçom no bar do Quincas, em São Paulo. Abalado, aceita a sugestão.

Em meados de 1941, os compositores Orlando Monella e Oswaldo França o convidam para gravar uma valsa de autoria deles: Se eu pudesse um dia, pela Cassio Muniz. Nelson retorna ao Rio, já com o acetato debaixo do braço e uma carta de apresentação para o diretor da RCA Victor, Lattari. Este ouve a gravação embevecido. Mas quando Metralha dispara a falar cuspindo as palavras na excitação do encontro, Lattari explode: “Essa voz do disco não é sua coisíssima nenhuma, seu gaguinho de uma figa. Ladrão de acetato, você roubou essa prova”. Foi preciso que Benedito Lacerda intervisse, explicando que tem gago que, quando canta, é um fenômeno. Para provar, Nelson teve que soltar o vozeirão ali mesmo, ao vivo, Se eu pudesse um dia / aos teus pés poria / toda a natureza…

Foi contratado. Mas e agora? Como é que ficava o lado B do disco? Só combinando parceria com um cartaz desses de nome feito. Só procurando um compositor do Café Nice para incluir no repertório.

Em 1941, era no grupo das calçadas que ele estava totalmente integrado. Contudo, precisava levar um papo com Ataulfo Alves, o compositor preferido do cantor das multidões, lá dentro do Café. “O que era bom para Orlando Silva, devia ser bom também para Nelson Gonçalves”, raciocina. Porém, sua alteza não podia ficar cantarolando no ouvido de um desconhecido qualquer dentro do Nice.Os dois vão até a rua da Carioca, onde Ataulfo dedilha aquele samba de sua lavra que cairia como uma luva na voz de Nelson: Sinto-me bem quando estou na solidão / sinto-me bem ao chorar por teu amor…Este foi o lado B do seu primeiro e antológico 78 RPM, gravado no dia 4 de agosto de 1941, do disco 34.807; no mesmo dia, Nelson grava o de número 34.821A com Formosa Mulher, de Constantino Silva e Oswaldo França, e o 34.821B, A mulher dos Sonhos Meus, de Ataulfo Alves e Orlando Monelli.

O disco estourou. Mas ele não era contratado da Rádio; e, sem grana e sem contrato, que fazer? tinha que se virar. Quem diria, acabou, então, lá na Passarela das Mariposas! … A maré não estava para peixe. Na Lapa, só tinha lugar para três tipos de homem: o malandro, o valente e o otário. “Um cantor desconhecido, naquele meio, só podia ser enquadrado no terceiro grupo: o dos otários”. lembrava o próprio Nelson, passados quase cinquenta anos. Malandro emborca uma cachaça fria no bar A Petisqueira e incorpora o pugilista de Taubaté, disparando o jab fulminante no queixo de um mulato bamba. Acontece que o otário era um tal de Camisa Preta, matador de mais de trinta, membro benemérito da confraria de Madame Satã, o valente mais bambambã da Lapa. Encurtando a história, já pelas tantas, todos se confraternizaram, bebemorando, e ainda lhe arranjam quatro marafas que deste dia em diante vão lhe pagar pedágio, além de lhe oferecer de graça o marquês-de-rabicó, é claro…! Mas como diz o ditado: em cachorro fraco, todo mundo que ser pulga!

Quinze mil rés de pedágio, naquela época, já era uma micharia. Francamente. Andava comendo o pão que o diabo amassou. Parecia cafetão de pão com manteiga, o que era muito diferentes desses cantoresinhos de cacife que já chegavam comendo bolo feito em casa. Sem contrato, desvairado, pensa em voltar para Paulicéia. Arma um barraco no Nice e dispara outro jab na boca do estômago de um caro colega: era Chico Alves, o velho Chico. Foi mal-entendido. É que Metralha andava na corda bamba, circuncisfláutico demais. Foi então que o amigo e padrinho Carlos Galhardo, nossa voz de veludo, o apresentou a Edmar Machado, diretor da Rádio Mayrink Veiga, que o contratou, no ato, por 600 mil rés. Não havia o que discutir. Estava com a alma do tutu. Era um sujeito cubanaculibra. Macho para caramba, aos 22 anos já estava separado de sua primeira mulher e já havia gravado 12 músicas, todas pela RCA Victor. Passavam-se os anos pitorescos de sua iniciação.

Aí, foi quando deu zebra no lado A do disco 34.948 e tiveram que gravar às pressas um fox que nem estava programado: Renúncia, música de Roberto Martins e Mario Rossi. Carolina Menezes fez o arranjo, Luiz Americano solou e Benedito Lacerda tocou com seu regional. Essa música gravada ao acaso e às pressas, no dia 27 de maio de 1942, foi um estouro na vida de Nelson Gonçalves. Em 1942/1943, Renúncia vendeu 35 mil cópias. Um recorde. Era o início da ascensão do nosso super-herói. O barão Stuckart o convida para ser crooner do Cassino no Copacabana Palace Hotel, com salário de 9 contos por mês. Era a melhor coisa que podia acontecer para um cantor. Nelson acontece, finalmente, no café soçaite. Abandona a Lapa e vira a casaca: vai morar no Leme, biscoito fino! Se subiu, ninguém sabe, ninguém viu…

Você sabia que a cantora Maria Bethânia ia se chamar Mary Gislaine? Pois é! Já pensou? Se não fosse o Maninho Caetano Veloso cantarolar o tempo inteiro no ouvido de dona Canô a música do Capiba, Maria Betânia, tu és para mim a senhora do engenho…, que era o maior sucesso na voz de Nelson em 1945, a nossa abelha-rainha ia estar numa enrascada! …

Amante apaixonada e não correspondida, Betty White, linda crooner do Copacabana Palace, toma dose excessiva de barbitúricos e é encontrada, já defunta, na cama barata de um quarto de hotel. Pivô da história? O cantor Nelson Gonçalves! Nessas alturas, já amancebado com a vedete Espanhola, Nacy Montez. No carnaval de 1946 a música Espanhola, de Benedito Lacerda e Haroldo Lobo, na voz de Nelson, era a mais cantada pelo povo nas ruas. Entra para o cast da Rádio Nacional; e daí para o lendário Cassino da Urca seria um pulo. Estava realmente casado com as fãs, os contratos milionários e a popularidade. Ah! … era o nosso macho de folhetim que declarava: “para ser adorado por uma mulher; convém amá-la pouco prometer muito e fingir sempre…”

Nesse glorioso ano de 1950, você podia ouvir no seu dial a transmissão do quarto Campeonato Mundial de Futebol aqui nos Estados Unidos do Brasil. O Estádio Municipal do Maracanã, palco do empolgante cortejo, recebia as seleções do Brasil e do Uruguai para a final da Copa do Mundo. A seleção uruguaia, comandada por Obdulio Varela, acabaria jantando o Brasil. Que desgraça! Getúlio Vargas rondava o poder. Puxa, o homem não tinha ficado no trono por quinze anos, renunciado e tudo? E agora? Sofrer, sofrer, sofrer…Que nada. O negócio preferido do nosso Metralha, não era nem futebobice nem politicagem, era mesmo sacanagem!

Em 1950, no Baile dos Artistas do Hotel Glória, havia o uso indevido de lança-perfume no salão e a mulherada nuinha em pelo. Elvira Pagã era a rainha e Luz Del Fuego a princesa da festa. Como o diabo gosta. No carnaval, a música Serpentina, de Haroldo Lobo e David Nasser, na voz de Nelson, era grande hit do momento. Juliette Grecco cantava na Rádio Nacional, VanjaOrico era contratada pela BBC de Londres, Jean Sablon despedia-se do Rio. Ah!, era uma época animada. Neste cenário, o caso tece seu trama: “Hum, quem é aquela moreneza fulminante que está cantando agora no Trio de Ouro?”, teria dito Metralha; “que corpinho; vocês viram a blusa de seda que abrigava o divino conteúdo?” (suspiros). O malandro estava despreparado: a nova deusa era a cantora Lourdinha Bittencourt. Tinha sido fisgado, flechado, picado fatalmente pelo veneno do amor. Lourdinha Bittencourt foi o grande amor de sua vida. Seu Pecado Ambulante. (Pois Dalva de Oliveira tinha sido substituída pela cantora Noemi Cavalcante, que por sua vez acabara de sair do Trio de Ouro). A estrela agora era ela.

Com Lourdinha, Nelson aprende a declinar o verbo amar. Sua vida se organiza. A influência benéfica de Maria de Lourdes se faz notar sobremaneira: começa a estudar de novo, a situação financeira se equilibra e seus bens são transformados em imóveis. Tinha que pensar no futuro. Desde 52 estava legalmente separado de D. Elvira num desquite amigável, realizado na Terceira Vara de Família do Rio de janeiro. Seu filho, Nelson Antonio, com onze anos, estava internado no Colégio Aquidabã, e a filha Marilene, de quatorze anos, cursava o terceiro colegial em Sampa. Queriam em breve assinar uma certidão no Uruguai, quando, então, dona Lourdinha se tornaria sua legítima esposa. A vida era um mar de rosas.

O ano de 1952 foi um marco na sua carreira emocional e profissional. Nos estúdios da Rádio Nacional, conhece outra estrela de sua vida, um compositor privilegiado, de quem gravaria mais de 370 composições: Adelino Moreira.  A partir desse encontro, ele entra numa nova fase. Sai da sombra de Orlando Silva, define seu estilo e marca definitivamente sua personalidade de intérprete. Torna-se o cantor oficial da dor-de-cotovelo e da boemia. Inventa o brega, olha que chique! No dia oito de maio grava o samba-canção Última Seresta, de Adelino Moreira e Sebastião Santana, até hoje um carro-chefe do seu repertório. Para os dois, aquele era o começo de uma bela amizade.

Sua interpretação de A Volta do Boêmio (12/10/56), de Adelino, atingiria no cômputo geral a cifra estupenda de dois milhões de cópias vendidas. Era a embriaguez do sucesso, a consagração do Rei do Rádio. No resto do mundo, tudo se abria para o novo: o cinema, o teatro, a bossa nova e a televisão Tupi. Inauguramos Brasília e ganhamos a Copa do Mundo. Nelson ia vivendo a vida. Havia recebido da gravadora, só neste último semestre, 733 mil cruzeiros de direitos fonográficos. Quanta euforia! Mas também nessas alturas o Rei do Rádio já tinha cinco filhos para cuidar! O casal havia adotado três crianças. Como Nelson sempre dizia: “é amis fácil sustentar dez filhos que um só vicio”. Parece que estava adivinhando. Do êxtase à queda foi um tombo fácil. Em 1955, sua interpretação da música Meu Vício é Você (a inesquecível Boneca de Trapo) já era um prenúncio sombrio do que as drogas, o ciúme, a euforia e os anos negros viriam operar em Nelson.

No mictório do restaurante El Greco, em Copacabana, Nelson experimenta um pozinho branco capaz de levá-lo à loucura. Uma cheiradinha. Uminha só. Era a nova onda, deixava legal. Entre a euforia e a solidão dos drogados, o Rei do Rádio viveu sua tragédia particular. De 1958 a 1966. Aos 39 anos, cheirava cocaína todo o dia e da boa. “Cheirei mais de 50 quilos de pó! Fiquei na roda 8 anos. Fiz coisa que até o diabo duvida”, confessou amargamente ao seu público, anos depois, já curado das drogas. Em 59, separa-se ruidosamente, dilacerado de ciúmes, de Lourdinha Bittencourt. O melodrama Fica comigo esta noite / e não te arrependerás…, música de 1961, é de autoria do compositor Nelson Gonçalves (em parceria com Adelino Moreira). Neste trecho de sua biografia encontra-se uma das maiores controvérsias: teria sido Lourdinha a responsável por ter apontado o marido à imprensa como toxicômano (veja bem eu disse à imprensa e não a polícia)? Tudo indica que a esposa tenha sido mesmo o personagem principal do polêmico (e talvez involuntário) “eu acuso”.

Uma outra história saborosa, que também nunca foi provada (mas foi sempre invejada): em 1961, o cantor milionário apresentava-se no palco do Rádio City Hall, em New York, nos Estados Unidos. Após o espetáculo, o mito Frank Sinatra teria vindo cumprimentar o Rei do Rádio nos camarins do teatro, rasgando sinceramente a seda para o nosso caruzinho: “May dear Nelson Gonçalves, I´m The Voice, butyouhaveoneofthegreatestvoicesI´veeverheard!”…(Será?, se houve ou se não houve alguma coisa entre eles dois, ninguém pode até hoje confirmar…). O sucesso de suas mais de 400 gravações permanecia ainda inabalável nesses primeiros anos de cocaína. Mas a situação estava ficando insustentável. Em menos de cinco anos, Nelson pulverizou sua carreira vertiginosa de cantor . Literalmente, de 58 a 66, sua carreira virou pó.

Torna-se, ele também, “uma dolorosa caricatura de si mesmo”, parafraseando Ruy Castro a respeito de Orlando Silva.  Nelson não tinha mais secreção nasal, mas a voz não se altera, graças a Deus. O coitado do Orlando, outra vítima das drogas que nem ele, teve sua voz completamente adulterada… “Mas meu soco ainda mata, cara, juro por Deus; vou viver mais cinquenta anos, e cantando!”, deve ter jurado, com muita fé em si mesmo, nosso Nelson. Porque naquele instante amargo de ostracismo, ele era um ídolo tombado. É preso e vai à lona. Fica atolado nesse pântano 8 anos. Em 1963, ninguém mais ouvia falar no Rei do Rádio. Em 1964, o Brasil, assim como Nelson, tinha virado mulambo.

Em 1965, rompe com o grande amigo e parceiro Adelino Moreira. Foi nessa época que ele se casou com sua então secretária, D. Maria Luiza da Silva Ramos, aquela que será a mulher para o resto da sua vida e com quem permaneceu casado até o fim de sua vida: mais de 30 anos de matrimônio. Juntos, iniciam um lento e cruel trabalho de recuperação. Era a derrocada final, a decadência. O Rei do Rádio era dependente, tinha que se curar.

Primeiro, tinha que se livrar dos traficantes aqui do Rio; o clima estava sombrio. Mudam-se, então, para São Paulo, no bairro do Brooklin Paulista. Pedem socorro ao Dr. Felipe Aché, médico da Casa de Saúde Liberdade de São Paulo, para livrá-lo da cocaína num tratamento decrescente. Maria Luiza rezava e Nelson lhe dava surras homéricas. “Ave Maria Cheia de graça, por que ela não me deixava sair?, quero buscar o pó! e ela não deixava,, o senhor é convosco, ela continua e seu batia mais e mais, perdoai os meus pecados”Nelson entrou nessa fase retroativa do vício quando foi preso em flagrante, em casa, diante dos filhos, no Dia das Mães, 5 de maio de 1966.

“Meu marido havia deixado de comprar cocaína das mãos do traficante Zé Mário, que era seu fornecedor. Foi esse traficante desgraçado, que agora está foragido, quem o denunciou à polícia dizendo que Nelson tinha cocaína em casa. Nós tínhamos sim,  10 gramas de entorpecentes, mas era para o tratamento do meu marido”… relembra, emocionada, Maria Luiza.

“Nós aqui abaixo assinados, os 3.000 presos da Casa de detenção de São Paulo, oferecemos um dia de cadeia da pena de cada um de nós, para que o prisioneiro Nelson Gonçalves seja libertado em troca”. E as vozes emocionadas dos condenados ecoaram num lamento plos corredores do presídio: “Boemia, aqui me tens de regresso, e, suplicante, te peço a minha nova inscrição”… É ou não é Nelson Rodrigues puro? Vem ai o seu epíteto de “O Último dos Moicanos”.

O casal pede ajuda ao Palácio Pio XII, na bênção do arcebispo de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns. Pedem proteção ao General Costa e Silva: que estendessem as asas do Exército sobre ele, pelo amor de Deus, ele estava se curando das drogas, por favor, e o Exército era tão forte! Em 1968, Nelson não cantava mais nada, era um farrapo, um trapo inútil. Consultam o médico Dr. Antonio Sete (que além de médico era maestro, o Maestro Totó, que havia sido colega do rei do Rádio nos idos tempos da Rádio Cruzeiro do Sul), quanto ao procedimento de desintoxicação num tratamento de choque. Ele era antes de tudo um macho. Queria parar de estalo, ia aguentar as consequências. Foram quatro meses de sofrimento insano. Tranca-se no quarto escuro, e numa batalha mortal, enfrenta a barra-pesada que vive um viciado quando resolve curar-se sem ajuda de ninguém. Um drama. É sintomático: Nem às Paredes Confesso, música de Arthur Ribeiro, Ferrer Trindade e M. de Souza, no ré gravíssimo do eterno romântico, é de 1969.

A travessia do inferno é um círculo de horrores, mas assim como um bom herói de capa e espada, ele teve, depois de crimes e castigos, o retorno. Machista convicto, para dar a volta por cima, provando que estava recuperado, organiza a já citada luta-exibição de boxe contra o campeão mundial dos pesos galo, Eder Jofre, no Estádio do ibiapuera, em São Paulo. É a volta triunfante do boêmio. Mas essa volta não foi assim tão gloriosa. A partir de 1968, os Gonçalves empreenderam um penoso trabalho de reconstrução profissional, financeira e moral. O recomeço tem sempre indignadas portas fechadas e poucos amigos leais. Mas eles estavam preparados:“não me abalo com a gentalha”, proferiu o valentão, imbuído de evidentes dotes morais. O cantor Francisco Petrônio, apresentador do programa baile da Saudade, na TV Excelsior, canal 9, por exemplo, contra-atacou disparando: “Nelson Gonçalves, minha senhora, é um produto impróprio para o consumo dos telespctadores do canal 9. A TV Excelsior é uma emissora familiar. Não permitimos viciados no meu programa”. O notável Sílvio Santos foi único amigo do peito naquela hora crepuscular: “Se o Nelson voltou a cantar, bota o Nelson pra cantar, ora essa! E não é nenhum de nós que vai julgar. Contrata o homem”.

No ostracismo da reserva há quatro anos, com a gravadora só reeditando suas seleções de ouro desde 1968, teriam que ter paciência e continuar fugindo dos taficantes. Finalmente, em 1971, a RCA o chama para gravar um novo LP, cujo título sutil era Cada na sua; o sucesso foi relativo. A entrada nos anos 70 foi dura. O Brasil estava atordoado e Nelson preocupado em entrar na nova onda tenta uma sintonia com a rapaziada: muda o visual, esquece os conselhos sábios do velho maestro Bellardi (blasfêmia!) e vai cantar bossa nova. Não era o cantor de todos os ritmos?, o Frank Sinatra brasileiro? Um equívoco. O repertório do cantor da barra-pesada dos rendez-vous de abat-jours lilás, do bambambã mais valente do pedaço, ele só consegue recuperar quando se reconcilia com o parceiro Adelino Moreira, depois de sete anos de afastamento. O “caixeiro-viajante das emoções” (na definição de Tarik de Sousa) grava o LP Boêmio 72 – Sempre Boêmio, Acerta na mosca.

“Sim, batia em mulher!”

“Sim, meses sem dormir!”

“Sim, impotente!”

Janeiro de 1973. Domingo, Programa da TV Globo: Só o Amor Constrói. No telão, close dramático do cantor, a face marcada pelas rugas da experiência. Palavras de Nelson para a apresentadora Marisa raja Gabaglia (com perdão de algumas licenças poéticas): “Agradeço a Deus, Nossa senhora das Graças e São Jorge! Obrigado, meu povo, me arrisquei aqui diante de todos, eu que fui do desastre ao triunfo, hoje, passei de réu a exemplo”!

Em 1975, o primeiro lugar nas paradas de sucesso na Bélgica era o samba-canção Naquela Mesa, de Sergio Bittencourt, na voz caliente de Nelson Gonçalves.Teve discos lançados na Itália, Inglaterra, Portugal, Alemanha, América Latina, na China… Até 1979, aos 42 anos de carreira, já havia vendido 35 milhões de discos. Recebeu 10 discos de platina e 20 de ouro. Ufa! Queremos ressaltar aqui um equívoco histórico imperdoável. Vejamos o que é a perspectiva moral dos tempos: com o advento de Wando, o obsceno, no final os anos 80, Nelson torna-se um respeitável cantor romântico. Hoje, é um clássico. Aos 62 anos de idade, em 1982, lança o LP Conclusão num Showmício monstro na Praça da Sé, em São Paulo, acompanhado pelo regional do caçulinha. Em 1984, sob a batuta do produtor José Milton, entra com tudo: chama jovens artistas para gravar com ele. Foi uma receita perfeita para não envelhecer nem cair no esquecimento. O Rei do Rádio prestou contas à modernidade, quando todos os ícones românticos do seu tempo já haviam parado de gravar ou fazer shows com regularidade. Ele era o único que continuava ali, firme. Seus convidados nos LPs Eu e Ela (84), Eu e Eles (85), Eu e Elas vol.2 (86) e Nós (87) foram, entre outros, Caetano Veloso, Alcione, Fagner, Maria Bethânia, Milton Nascimento, Chico Buarque, Lobão…, calma aí! Dinossauro cantando com roqueiro dá samba? E deu. A Deusa do Amor, de 1987, é a prova disso. “Essa dupla dramática é história, é memória, filho”, ensina o velho guerreiro. “E tem mais”, continua “quem escreve um livro sobre música popular e não me cita, também comete uma injustiça. Corri o Brasil inteiro, cada cidade. De avião, de trem, de carro, de burro, de jerico. Merecia maior atenção na fixação do meu nome na história da MPB. Porque as FMs não programam mais as músicas do Rei do Rádio?”, vocifera Nelson. “É discriminação; aí tem muita mutreta, grana, jabá, país do jabaculê”.

Em 1986, a boêmia chega ao Planalto Central: El macho na Constituinte tenta agora a deputança e a vereadagem. Foi candidato derrotado pelo PFL de Minas Gerais, com 14.583 votos, ficando em décimo terceiro lugar como suplente. Em 1988, disputa um lugar na Câmara dos vereadores pelo PJ, o partido da Juventude, aos 69 anos de idade – Nelson Gonçalves, uma vez a serviço da família niteroiense, não foi ouvido. Desistiu da candidatura: “Agora não me candidato a mais nada, só a rei Momo pra apalpar o bumbum das moças”.

Em 1989, lança uma caixa de cinco discos, 50 Anos de boêmia, e estréia o antológico espetáculo Nelson Gonçalves 50 anos de Boêmia ao Vivo, no Olímpia, em São Paulo, com orquestra e músicos de primeiríssimo time, como Raphael Rabello, Chique, cheio dos trinques, estava o nosso menino! “Não tenho medo de nada. Nem de guerra, bomba, morte, bandido, revolução ou desaforo. Durmo como um anjo, sem comprimidos. Sou desassombrado”.

Aos 76 anos de idade e 55 de carreira, o bambambã ainda batalhava: show no Palace, em são Paulo, no canecão no Rio, em teatros de Manaus, participava de entrevistas no Jô, se associa na época com a velha guarda das escolas de samba, deu canja em LP celebração dos Mutantes, fez e desfez velhas e novas parcerias; matou a cobra e mostrou o pau; foi invulnerável a tudo: críticas, mau tempo, pouco caso, ao que possam dizer ou pensar. Tem o corpo fechado”… ele que nunca teve fã-clube na vida” “Não me interessa ser o número um em Miami ou o segundo em Veneza: pra ser feliz, quero o quinto lugar nas paradas de Madureira ou o terceiro na periferia de São Paulo”. E, lapidar, sentencia:“Tenho que batalhar, eu sou o último besta. Hem”! Carapa, vamos gravar!”.

Em 18 de abril de 1998, o cantor Nélson Gonçalves morreu após um ataque cardíaco, aos 78 anos. Com mais de 60 milhões de discos vendidos ao longo de sua carreira, iniciada aos 17 anos,

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