Querem tomar o Maracanã de Mário Filho.
por Ediel Ribeiro
Depois de roubarem o busto do jornalista, agora querem roubar o nome do Estádio.
Na última quarta feira – sem nada o que fazer, já que o Rio anda às mil maravilhas – André Ceciliano, (PT- RJ), presidente da Alerj resolveu, por Decreto de Lei, rebatizar o “Estádio Mário Filho” de “Estádio Edson Arantes do Nascimento – Rei Pelé”.
Nem em meus pesadelos futebolísticos mais tenebrosos jamais ousaria imaginar que alguém um dia tentaria mudar o nome do “Maior Estádio do Mundo”, conhecido mundialmente.
Da cabeça de políticos pode se esperar que saía tudo, menos coerência. Com a ideia de jerico do petista – um assassinato cultural movido pela ignorância – sabemos, agora, que ele não entende nada de esporte, especialmente do futebol e sua história.
Pelé foi importante para o futebol? Foi. Tanto foi que tem um estádio em Maceió (Estádio Rei Pelé) com o seu nome.
Mário Filho foi importante para o jornalismo, para a literatura, para o esporte, para o futebol, para a música e para o carnaval do Rio de Janeiro.
Mário Leite Rodrigues Filho, nascido em Pernambuco, foi o responsável por tirar o jornalismo esportivo da marginalidade. Com Mário o futebol e os esportes, antes restritos às últimas páginas dos jornais, chegaram à primeira página.
A família deixou Pernambuco e veio para o Rio em 1915.
No Rio, seu pai, Mário Rodrigues, fundou os jornais “A Crítica” e “A Manhã”. Neles, trabalhavam os filhos Roberto Rodrigues, ilustrador; Mario Filho e Nelson Rodrigues, repórteres.
Apaixonado por futebol, um dia, encarregado do fechamento do jornal, colocou na capa do “A Crítica” – um diário notadamente político – a notícia sobre o clássico entre Flamengo e Vasco – manchete absolutamente inexistente na época.
Seu pai, um crítico do esporte, ficou furioso com a manchete. Mas todos os exemplares se esgotaram nas bancas. Nascia ali, um dos mais audaciosos jornalistas esportivos do país.
Em 1930, Mário Rodrigues faleceu e os jornais fecharam. Mário, então, conseguiu um emprego n´O Globo. Lá ficou amigo de Roberto Marinho, que ainda não era o homem mais poderoso da mídia nacional.
Paralelamente ao trabalho como colunista, fundou o “Mundo Esportivo”. O jornal durou pouco tempo mas popularizou expressões como “Fla-Flu” e “perna de pau”, entre outras.
Com a escassez de eventos esportivos e culturais, ele teve uma ideia que marcaria para sempre o Rio de Janeiro e o Brasil, o “Concurso de Escolas de Samba”, embrião do que viria a ser “o maior espetáculo da Terra”. O primeiro certame aconteceu em 1932, na Praça Onze, tendo a Mangueira campeã dentre 19 agremiações. Com sua atuação, Mário Filho contribuiu para construir no imaginário coletivo os dois maiores símbolos nacionais: o samba e o futebol.
Na época, com Roberto Marinho, comprou o “Jornal dos Sports”, que rapidamente se popularizou entre os apaixonados por futebol no Rio de Janeiro.
Ali, Mário criou os “Jogos da Primavera” (1947); os “Jogos Infantis” (1951) e o “Torneio de Pelada do Aterro do Flamengo”.
No final da década de 40, foi uma das personalidades que lutou pela construção do Maracanã no terreno onde ficava o Derby Clube, no bairro de mesmo nome. Foi opositor de Carlos Lacerda que queria ver o estádio erguido em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
O jornalista não queria apenas mais um estádio, mas sim o “maior estádio do mundo”. Com o estádio pronto, Mário trabalhou para a retomada do Torneio Rio-São Paulo que posteriormente incluiria clubes de outros estados e seria renomeado “Taça Roberto Gomes Pedrosa”, que originaria o atual “Campeonato Brasileiro”.
Escreveu livros que ajudaram a popularizar o futebol e combater o racismo no esporte. O primeiro, de 1947, “O Negro no Futebol Brasileiro”, sobre a entrada dos afrodescendentes no futebol; “Viagem em Torno de Pelé”, onde retrata o início da carreira do Rei do Futebol; “A Copa do Mundo de 1962”; “Histórias do Flamengo”; e os romances “Infância de Portinari”; “Romance no Futebol” e “O Rosto”.
Por medo de avião, cobriu apenas duas Copas do Mundo, a de 1962, no Chile, e a de 1966, na Inglaterra.
Morreu poucos meses depois da derrota do Brasil, em 66, vítima de um ataque cardíaco. Sua importância para o futebol e para o jornalismo esportivo foi tanta que Nelson Rodrigues escreveu: “Mário Filho foi tão grande que deveria ser enterrado no Maracanã”.
E não ter seu nome tirado dele.
*Ediel Ribeiro é jornalista e escritor.
foto divulgação