Poder, Partido e Patrimônio: A Política Geoeconômica de Xi Jinping
*Por Igor Lucena
O sétimo presidente da Republica Popular da China, Xi Jinping, caminha para entrar na história e se tornar um dos líderes mais celebrados do Partido Comunista Chinês, ao lado de Mao Tsé-Tung e Deng Xiaoping. Ao contrário dos seus pares que marcaram a nação com a revolução cultural e a abertura econômica, atualmente acompanhamos Xi elevá-la a um novo e mais ousado patamar do Capitalismo de Estado.
Uma das bases do desenvolvimento econômico chinês está ‘ancorada’ nas suas empresas estatais, que, ao contrário do Brasil, disputam mercados consumidores e buscam extrair recursos naturais em todo o planeta. Entretanto, tal como no Brasil, suas estatais ainda apresentam retornos menores do que suas empresas privadas. Neste contexto, Xi Jinping vem introduzindo uma nova política de atração de investimentos privados para essas estatais com o objetivo de torná-las mais rentáveis e ao mesmo tempo desejando impor uma cultura corporativa mais voltada ao mercado.
Por outro lado, junto às empresas privadas chinesas, o governo de Pequim vem avançando com a criação de conselhos internos com membros do partido dentro das companhias, procurando também incentivar à filiação de dirigentes e diretores privados como novos quadros do Partido Comunista Chinês, deste modo procurando alinhar mais os interesses do Governo com os das empresas privadas, ao mesmo tempo exercendo um controle indireto sobre projetos e planejamentos de longo prazo.
Essa nova estratégia geoeconômica faz parte do maior poder de controle exercido pela administração de Xi Jinping e cria um entrelaçamento ainda maior entre as empresas públicas e privadas. Neste novo contexto, ficará cada dia mais difícil diferenciar o que é uma State Owned Enterprise de uma Multinational Corporation. Como a geoeconomia é uma ciência que estuda os efeitos políticos na economia e vice-versa, esse tipo de ação tem profundas mudanças na relação da China com o mundo.
No âmbito da política interna, essa ação passa a valorizar e a reafirmar o poder de Xi Jinping como o líder maior da nação, exercendo ao mesmo tempo um controle centralizado e descentralizado sobre os rumos da economia, ampliando a influência dos empresários ao receberem benesses do Estado e ao mesmo tempo ampliando o poder de membros do partido sobre setores importantes da economia e empresas que operam para além das fronteiras nacionais.
No campo da política externa, as companhias chinesas passam a receber um respaldo maior do Estado tanto em questão de lobby internacional e de financiamentos de longo prazo quanto de possibilidade de expansão internacional com o objetivo de tornarem essas companhias campeãs globais.
Em seu último discurso nacional, Xi Jinping ressaltou o que ele chama de Socialismo com características chinesas, ou Socialismo do século XXI, como principal instrumento que deverá guiar o povo chinês, refutando o capitalismo baseado no modelo anglo-saxão e norte-americano. Sua frase é uma espécie de releitura da ideia da chamada Golden Cage, cunhada por Deng Xiaoping em que fazia uma analogia na qual o capitalismo era um pássaro capaz de voar alto e veloz (fazendo referência à prosperidade do mercado), mas que ele sempre estaria preso na gaiola dourada do socialismo político e do poder do Estado.
Neste contexto Xi Jjinping não apenas compreende, mas reafirma que a base fundamental da manutenção do poder interno do partido, e consequentemente seu próprio poder sobre a nação, depende intrinsecamente da constante melhora na qualidade de vida da população; ou seja, na expansão do patrimônio econômico dos chineses, algo que vem ocorrendo desde 1978.
Essa expansão do patrimônio dos chineses passa necessariamente por ampliar o poder da China no campo externo, e essa estratégia é algo que vem sendo executada anualmente com a maior participação no comércio mundial, passando de 3%, em 1995, para 12,5%, em 2018, pelo aumento do nível de Investimento Direto Estrangeiro em todos os continentes. Além disso a China compreende a importância de ter se tornado o maior parceiro comercial de países como os Estados Unidos, o Brasil e o Japão, entre dezenas de outras nações.
Vale lembrar que os chineses não optaram por esse caminho de uma maneira experimental, essa política geoeconômica foi implementada depois de muito estudo de projetos oriundos da Inglaterra, dos Estados Unidos e de outras potências globais que serviram de base para a política geoeconômica chinesa, claro que com suas próprias adaptações políticas.
Apesar de que a pandemia da Covid-19 tenha alertado várias nações sobre os objetivos políticos e econômicos das empresas chinesas, assistimos hoje a mais um capítulo do chamado desenvolvimento do capitalismo híbrido, em que não apenas a China, mas outras nações visam expandir o seu poder geoeconômico e sua influência na busca de novos mercados consumidores e fontes de matérias-primas, por meio de Multinational Corporations, State Owned Enterprises e Sovereign Wealth Funds.
*Igor Macedo de Lucena é economista e empresário, Doutorando em Relações Internacionais na Universidade de Lisboa, membro da Chatham House – The Royal Institute of International Affairs
e da da Associação Portuguesa de Ciência Política