Palavra livre, democracia forte

“A palavra aborrece tanto os Estados arbitrários, porque a palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade. Deixai-a livre, onde quer que seja, e o despotismo está morto”
Rui Barbosa

É com profunda preocupação que as organizações abaixo-assinadas têm acompanhado as ofensivas voltadas a jornalistas e a diversos veículos de comunicação no Brasil.

Têm se tornado recorrentes as declarações e ações, por parte de atores políticos e setores da sociedade, que desqualificam e atacam o trabalho realizado pela mídia no país. Há um clima de cerceamento da liberdade de expressão que busca calar profissionais no exercício de seu ofício quando divulgam informações ou emitem opiniões contrárias aos interesses ou às preferências políticas deste ou daquele grupo. 

Foi este o caso com Rachel Sheherazade, que teve sua demissão pedida por um dos principais patrocinadores do veículo de imprensa para o qual trabalha. Episódio semelhante se passou com Marco Antonio Villa, comentarista afastado de sua emissora de rádio (da qual se demitiu na sequência) em virtude de críticas que contrariavam a direção da emissora. O mesmo tendo ocorrido com Paulo Henrique Amorim, ao que tudo indica afastado de seu programa de TV em razão de divergências políticas. Recebemos, aliás, com grande pesar a notícia de seu falecimento na última quarta-feira (10), cientes de que o jornalismo brasileiro perde uma figura de relevo e notável por seu compromisso com o exercício das liberdades de expressão e de imprensa.

Alimentam e agravam o clima de constrangimento de liberdades, atos protagonizados por força do Estado. Como o pedido feito pelo ministro do STF Alexandre de Moraes de retirada do ar de conteúdos publicados pelo Crusoé e O Antagonista em março deste ano, a proibição, imposta pelo Presidente do ICMBio, de que chefes de Unidades de Conservação conversem com o jornalista André Trigueiro e as suspeitas mais recentes de uso da máquina do Estado na tentativa de intimidar Glenn Greenwald em função da série de reportagens do The Intercept Brasil sobre a Operação Lava Jato.

Isso para citar apenas alguns dos fatos inquietantes sobre as condições de atuação da imprensa e dos jornalistas nesses últimos tempos.

Não é à toa que, segundo o Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa 2019 elaborado pela organização Repórteres Sem Fronteiras, o Brasil teve queda em sua colocação e está em “situação sensível” quanto à liberdade de imprensa em seu território. A Artigo 19, por sua vez, produziu uma síntese de situações de risco à atuação da imprensa nos 100 primeiros dias do governo.

As liberdades de expressão e de imprensa são essenciais para o bom funcionamento de qualquer democracia. Não importa se as ideias ou as notícias vão ou não contra nossas posições políticas ou preferências ideológicas, é preciso reagir a cada tentativa de cerceamento de liberdade de expressão e de imprensa. Como determina o art. 220 da Constituição Federal, “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição” e fica “vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística” (§ 2º). 

Precisamos estar atentos. A propensão a restringir liberdades civis de oponentes, inclusive da imprensa, é um dos elementos comuns da derrocada das democracias identificadas por Steven Levitsky e Daniel Ziblatt em seu livro Como as Democracias Morrem.

Em uma sociedade marcada cada vez mais pela intolerância ideológica e pela disseminação de notícias falsas para manipular o debate público, a missão de cultivar e defender a livre expressão de ideias e a liberdade de imprensa torna-se ainda mais premente. 

Assinam: 

– Organizações

1. Abong – Associação Brasileira de ONGs

2. Ação Educativa

3. Associação Tapera Taperá

4. Atados

5. Casa Fluminense

6. CEDAPS

7. CENPEC Educação

8. Delibera Brasil

9. Frente Favela Brasil

10. Fundação Avina

11. Fundaçāo Tide Setubal

12. Geledès-Instituto da Mulher Negra

13. Gestos– Soropositividade

14. Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para Agenda 2030

15. Imargem

16. INESC – Instituto de estudos socioeconomicos

17. Instituto Alana

18. Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – Idec

19. Instituto Cidade Democrática

20. Instituto Construção

21. Instituto Ethos

22. Instituto de Defesa do Direito de Defesa

23. Instituto de Desenvolvimento Sustentável Baiano

24. Instituto de Governo Aberto

25. Instituto Physis- Cultura & Ambiente

26. ISER – Instituto de Estudos da Religião

27. Instituto Sou da Paz

28. Livres

29. Move Social

30. Movimento Boa Praça

31. Observatório do Terceiro Setor

32. Open Knowledge Brasil

33. Oxfam Brasil

34. Pacto Organizações Regenerativas

35. ponteAponte

36. Programa Cidades Sustentáveis

37. Rede Conhecimento Social

38. Rede Feminista de Juristas – deFEMde

39. Rede Justiça Criminal

40. Rede Nossa São Paulo

41. Rubens Naves Santos Jr. Advogados

42. Szazi, Bechara, Storto, Rosa e Figueirêdo Lopes Advogados

43. Transparência Brasil

– Parlamentares

1. Alexandre Padilha PT/SP

2. Andreia de Jesus PSOL/MG

3. Áurea Carolina PSOL/MG

4. Bancada Ativista PSOL/SP

5. Bella Gonçalves PSOL/MG

6. Cida Falabella PSOL/MG

7. Felipe Rigoni PSB/ES

8. Marina Helou REDE/SP

9. Paulo Teixeira PT/SP

10. Randolfe Rodrigues REDE/AP

11. Rodrigo Agostinho PSB/SP

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