Medida emergencial do novo governo para educação superior deve ser a reestruturação do FIES
‘Revogaço’ para leis anti-ambientais e armamentistas, mutirão de vacinação na área da saúde e outras medidas emergenciais de impacto começam a surgir como demonstração de um novo direcionamento nas políticas públicas em muitas áreas com a chegada do novo governo.
Enquanto isso, milhões de jovens se esforçam para alcançar o melhor nível possível no ENEM sem saber ao certo em que sentido caminhará o ensino superior a partir de 2023.
O fato de ainda não ter surgido nenhum anúncio de medida concreta na área da educação talvez seja explicado pela constatação de que esta foi uma das áreas mais afetadas pela falta de um planejamento estratégico do time que deixará a Esplanada dos Ministérios no final de dezembro.
As constantes mudanças de ministros e a falta de um norte para as ações de todos eles, construíram um legado de desestruturação no qual parece que tudo precisa ser feito desde o começo. Somando a isso, há uma sensação de que mesmo acertando muito o tempo não será suficiente para terminar o serviço e fazer com que o tema volte aos trilhos.
Seja como for, a realidade impõe que se escolha um novo começo. Neste sentido, nada parece mais urgente do que revisar as exigências documentais para a concessão do FIES com foco na ampliação do acesso ao ensino superior.
Nos últimos anos, o FIES vem registrando um número cada vez menor de participantes, pois a parte documental exigida é praticamente impossível de ser atendida. Talvez, justamente para evitar que as pessoas necessitadas tenham como fazer o pedido, o governo passou a exigir comprovação de renda com dados tão difíceis, que nem mesmo a Receita Federal possui.
Essa dificuldade já foi questionada por várias instituições e entidades ligadas à educação que já consideram esse financiamento como existente já que ele é feito para que ninguém tenha acesso. Desta forma, as cerca de 600 ou 700 mil vagas que havia nos melhores tempos do FIES caíram para 200 mil e, de fato, nem 30 mil delas são preenchidas com a concessão do financiamento.
Afirmar que este excesso de documentação terá impacto na redução da inadimplência do FIES é negar a realidade de que grandes marcas de varejo como Casas Bahia e Magalu, por exemplo, não pedem este nível de comprovação e nem de longe são vítimas de um nível de inadimplência que inviabilize o negócio.
O grande problema do FIES não está em quem toma o crédito. O problema é saber se aquelas vagas que estão sendo oferecidas têm valor real para as pessoas. Se o jovem se forma em um curso que efetivamente lhe dará condições de construir uma carreira, ele terá condições e orgulho de arcar com suas responsabilidades.
Outra questão a ser resolvida com relação ao FIES, é a diferença entre o valor que as instituições de ensino cobram no modelo particular e o preço que elas praticam quando negociam o financiamento com o governo.
Uma prática muito comum é a faculdade ou universidade oferecer um curso de R$ 300 por mês quando contratado pelo aluno no balcão desta instituição e cobrar do governo R$ 1.500 por mês referente a este mesmo curso para financiamento pelo FIES.
Encontrar fórmulas para combater esses gargalos para o FIES é fundamental para o governo alcançar os benefícios de ter uma geração preparada para o mercado de trabalho.
Esta é, sem dúvida, uma medida emergencial com impacto direto no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), que, por sua vez, movimenta um ciclo vicioso com impacto em outras áreas.
Quando o país oferece melhores condições de vida aos seus cidadãos, os financiadores cobram menores taxas de juros. Então, ampliar o acesso à educação no nível superior é um benefício que conduz à obtenção de dinheiro mais barato e à diminuição da dívida do país. Desta forma, certamente existem outras ações emergenciais na área da educação, mas a reestruturação do FIES deve estar no topo de qualquer lista de prioridades.
* Francisco Borges é mestre em Política Pública de Ensino e consultor da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT).