Campanha pede à BRF melhores condições para porcos e maior cuidado com a saúde humana
A organização de proteção animal Sinergia Animal pede à BRF políticas de bem-estar animal para porcos, como fim de mutilações sem anestesia e analgesia e controle do uso de antibióticos
A ONG internacional de proteção animal Sinergia Animal lançou uma campanha pedindo à BRF, dona de marcas como Sadia e Perdigão, que adote políticas para reduzir o sofrimento dos animais na produção industrial de carne suína. Entre as demandas, estão que a empresa tenha maior transparência quanto a seus processos de auditoria, pare de usar antibióticos em animais saudáveis, elimine completamente o uso de gaiolas de gestação para porcas e cesse a mutilação das caudas de leitões sem anestesia. A petição direcionada à empresa já conta com mais de 75 mil assinaturas e pode ser acessada pelo link www.sinergiaanimalbrasil.org/
“A falta de um compromisso claro com o fim dessas práticas impede que os consumidores e entidades da sociedade civil tenham uma visão clara do que acontece dentro das fazendas que são fornecedoras da BRF. Como maior produtor nacional de carne suína, a BRF tem plenas condições de melhorar seus padrões de bem-estar animal”, afirma Lúcia Gomes, diretora global de campanhas da Sinergia Animal. “Por exemplo, pedimos auditorias transparentes para que técnicos especializados de organizações de proteção animal possam visitar as granjas comprometidas com essas mudanças”, completa.
Nas atuais circunstâncias, as porcas gestantes passam longos períodos em gaiolas onde ficam praticamente imobilizadas, sem poder caminhar e até mesmo girar ao redor do próprio corpo. Os filhotes passam por procedimentos dolorosos, como corte de cauda, sem nenhum tipo de anestesia para alívio da dor. Ambos os procedimentos são considerados por ativistas e cientistas da área de bem-estar animal como algumas das piores práticas da pecuária, por comprovadamente causarem intensa dor, sofrimento e estresse aos animais. Por esse motivo, as gaiolas de gestação já são completamente proibidas em países como Reino Unido (desde 1999), Suécia (desde 2004), Finlândia, Noruega e Suíça.
O Brasil foi na contramão dessa tendência mundial ao publicar, no final de 2020, uma Instrução Normativa que permite o uso de gaiolas de gestação por até 35 dias. “Consideramos que esse período ainda é demasiado longo, e agora está nas mãos das empresas reduzirem esse tempo”, avalia Lúcia. “Em relação às porcas gestantes, a BRF afirma que está mudando para gestações coletivas. Porém, suas comunicações também informam que as gaiolas de gestação ainda são permitidas por até 28 dias nas granjas fornecedoras, o que não é aceitável”, pontua.
Antibióticos e a “pandemia invisível”
“É importante usarmos esse momento de pandemia para conscientizar sobre os impactos da pecuária intensiva também para a saúde humana. A própria Covid-19 é confirmadamente uma doença zoonótica (originada em animais e passada para humanos), e cientistas de instituições de peso como o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) acreditam que a produção industrial de animais para consumo humano, sobretudo porcos e frangos, tem potencial para se tornar uma fonte de possíveis surtos de bactérias resistentes ou até mesmo futuras pandemias”, explica Lúcia. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 75% de todos os patógenos emergentes que infectaram humanos na última década se originaram em animais.
Um dos fatores que contribuem para esse risco é o uso indiscriminado de antibióticos, o que pode levar ao aparecimento de novas variantes de bactérias resistentes em animais explorados para consumo humano e a uma baixa na eficácia dessas drogas na medicina animal e humana. De acordo com a OMS, doenças causadas por bactérias resistentes já matam pelo menos 700 mil pessoas a cada ano, e estima-se que até 2050 esse número suba para 10 milhões por ano, se nenhuma medida for tomada. Por esse motivo, especialistas já descreveram o tema como uma “pandemia invisível”.
Estima-se que 75% dos antibióticos consumidos no mundo são destinados à pecuária. Um estudo global realizado em 2019 revelou que o sul do Brasil já faz parte da preocupante lista de locais classificados como focos de resistência microbiana, sobretudo quando se consideram os antibióticos mais comuns na produção animal, como tetraciclinas, sulfonamidas e penicilinas.
Em seu site, a BRF afirma que não usa antibióticos como promotores de crescimento, mas não possui um compromisso totalmente claro em relação ao seu uso profilático, ou seja, à administração de antibióticos em animais que não estão doentes. “É urgente um maior controle e acompanhamento de como está sendo feito o uso de antibióticos nos animais. O uso irrestrito, em animais saudáveis, representa uma grave ameaça à saúde pública. Queremos que a BRF se comprometa a tomar medidas para proteger a saúde das pessoas”, diz Lúcia.