PL 6.159 que dispõe sobre o trabalho para portadores de deficiência é um perigoso retrocesso social
Praticamente tinha desistido de falar publicamente de política, pois infelizmente é um assunto que acaba gerando confusão, mas dessa vez não podemos de forma alguma ficar em silêncio, dadas as ameaças e consequências do Projeto de Lei 6.159/2019, assinado pelo ministro da Economia, Paulo Roberto Nunes Guedes. Independentemente da sua posição política, aconselho a não deixar de se manifestar contra o PL 6.159, que retira a obrigatoriedade das empresas de contratar pessoas com deficiência.
O cidadão brasileiro pode inclusive demonstrar sua insatisfação publicamente, respondendo a uma enquete no site da Câmara dos Deputados, que trata do assunto, inserindo, também, sua própria opinião. Naquela página há a íntegra do projeto: https://www.camara.
O fato concreto é que o Brasil é um país, de acordo com a história, bastante injusto socialmente, com grande concentração de riquezas e um profundo abismo social. Só as pessoas que têm, por exemplo, problemas físicos ou que convivem com elas sabem como é difícil a inserção de uma Pessoa com Deficiência (PCD) no mercado de trabalho. Até mesmo conseguir uma escola particular inclusiva é uma tarefa extremamente árdua (mesmo a lei obrigando a inclusão). Eu pessoalmente sofri com essa situação, quando constatavam que meu filho, João Victor, de 7 anos, era autista, após visitarmos dezenas de escolas, onde sempre comunicavam cinicamente que “não tinham mais vagas”.
No mundo há algumas coisas que, lamentavelmente, só funcionam porque a lei obriga, e não se enganem, a contratação de PCD é uma dessas situações. Um parecer da procuradora do Ministério Público do Trabalho, Janilda Guimarães de Lima, interpreta que a proposta em tramitação no Legislativo infringe Convenção da ONU, principalmente porque a ideia prejudica substancialmente a vida das pessoas com deficiência, inclusive sem qualquer participação no projeto de lei de suas entidades representativas.
Entre outros pontos negativos, o texto suprime a cota de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, criando situações que dificultam a fiscalização do Ministério Público do Trabalho e dos Auditores Fiscais. O conteúdo impõe aos deficientes, mesmo que não tenham condições para tal, a obrigatoriedade de se reabilitarem ou habilitarem para suas atividades profissionais, e caso não consigam trabalhar de acordo com o interesse do empregador, podem não conseguir mais atuar no mercado de trabalho e perder seus benefícios.
Há também mais uma série de outras implicações no caso de o PL ser aprovado. As mudanças prejudicarão sobremaneira esses indivíduos, mas também as respectivas famílias das Pessoas com Deficiência. Na hipótese de que a lei seja assinada, esse universo de brasileiros ficará condenado a voltar a viver numa espécie de prisão domiciliar, como era no passado.
Seja você de direita, de esquerda, comunista, anarquista, liberal, enfim, seja lá o que você for, não fique a favor de um retrocesso absurdo desses. Esse projeto não pode passar em hipótese alguma!
João Raposo é advogado, pós-graduado em direito penal pela Universidade Mackenzie, com especialização em crimes financeiros pela FGV e curso intensivo de negociação pela Harvard Law School. É sócio fundador do escritório Raposo Soares e Salomé Advogados.