Lei impede que relatório da CPI da Covid seja esquecido pelo MP
Código de Processo Penal dá prazo para que órgão se manifeste sobre denúncias
O artigo 46 do Código de Processo Penal determina que o Ministério Público (MP) e a Procuradoria Geral da República (PGR) se manifestem sobre o relatório da CPI da Covid no prazo de 30 dias e fornece mecanismos para que as denúncias não sejam automaticamente engavetadas ou ignoradas: a chamada ação penal privada subsidiária da pública.
A jurista e mestre em Direito Penal pela PUC-SP Jacqueline Valles explica que o MP ou PGR podem permanecer inertes, mas isso não significa que o processo pode ficar parado ou esquecido. O MP, que é responsável pelos casos de réus que não têm foro privilegiado, e a PGR, que responde por ações de réus com foro privilegiado, podem se manifestar determinando a denúncia ou o arquivamento. “Se os órgãos não fizerem nada nesses 30 dias, qualquer pessoa ou entidade pode ingressar com uma ação na Justiça, chamada de ‘ação penal privada subsidiária da pública’. Nesse caso, o advogado dessa parte pode assumir a condução do processo. Diante disso, o MP ou a PGR pode dar continuidade à ação ou pode acompanhá-la como fiscal da lei. Se os órgãos oficiais assumirem a ação, o advogado da entidade que entrou com a ação penal privada pode ingressar como assistente de acusação para se certificar de que o processo terá o andamento adequado”, explica Jacqueline.
O relatório final da CPI da Covid apresentado nesta quarta-feira pelo Senado pede o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro por nove crimes supostamente cometidos durante a gestão da pandemia. Somadas, as penas chegam a 40 anos de prisão e ensejam a abertura de processo de impeachment.
O documento pede ainda o indiciamento de outras 65 pessoas, entre elas, três filhos do presidente que exercem mandato no Legislativo. O relatório, que ainda precisa ser aprovado no Senado por maioria simples, pede o indiciamento de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e Carlos Bolsonaro (Republicanos) por incitação ao crime, conforme previsto no artigo 286 do Código Penal.
Os crimes do presidente
O relatório da CPI pede que o presidente seja indiciado pelos crimes de epidemia com resultado morte; infração de medida sanitária preventiva; charlatanismo; incitação ao crime; falsificação de documento particular; emprego irregular de verbas públicas; prevaricação; crimes contra a humanidade e crimes de responsabilidade (violação de direito social e incompatibilidade com dignidade, honra e decoro do cargo).
Caso a PGR denuncie o presidente por crimes de responsabilidade, ele pode sofrer um processo de impeachment.
Prerrogativas da CPI
A CPI não tem o poder de punir os investigados mas, para a Justiça brasileira, o seu relatório equivale ao de um inquérito policial. O Ministério Público e a Procuradoria Geral da República devem analisá-lo, aceitando a denúncia, arquivando o processo ou solicitando investigações complementares, que devem ser feitas pela Polícia Civil ou Federal.
O Código de Processo Penal permite, ainda, que a PGR se responsabilize por todas as investigações, como aconteceu no caso do Mensalão. “Nesse caso, todos os réus, mesmo os que não têm foro privilegiado, serão julgados pelo STF. Para isso, a PGR precisa fazer uma solicitação formal. Se isso não acontecer, cada promotor no seu estado pode ingressar com ações contra os réus individualmente”, completa Jacqueline.