Aracati, berço do abolicionismo cearense

Por Rogério Morais
Por que razão eu posso afirmar que Aracati é, e deve sim, ser considerada o #BERÇO DO ABOLICIONISMO CEARENSE? Um povo de índole abolicionista e de militantes contra a dominação colonialista, portanto, um grande destaque da História cearense que tem olhos cegos nas autoridades em geral desde o início e meio de seu passado provincial.

Depois de visitada pelos navegadores europeus – os descobridores da América – antes mesmo do 1500 de Cabral, quase 300 anos depois, Aracati ainda se impunha como uma parte da colônia “independente” dos Governadores-gerais ou vice-reis, dificultando o braço curto da Coroa nas ações em todo o Nordeste.

Em um contexto histórico global, assim como na França após a sua revolução, inspirada na liberdade iluminista e movimentos contra a escravidão, abolicionistas de diversas classes sociais, religiosas, republicanos, intelectuais, brancos e negros fujões e/ou alforriados de todas as partes do Brasil, além de estrangeiros, chegaram a Aracati e fortaleceram os ideais libertadores.

O CEARÁ FOI SEMPRE ASSIM!
Lembra a tese do jornalista e professor Luís Sérgio Santos (cearense tem sangue viking/escandinavo)? Se nem tanto, conforme outras pesquisas, pelo menos (Ceará, Terra de Gallegos), sem dúvidas que aqui já aportavam pela boca do Jaguaribe povos fugidos ou não do outro lado do mundo e avançaram sertão a dentro com suas bugigangas valiosas, encantando o maturo.

Por lá e outros portos naturais do largo litoral cearense, bem antes do domínio real da Coroa, avançaram nas nossas matas e serras, gente de várias nacionalidades que fugiam das guerras e das ditaduras; africanos fugidos, todos com ideais, vontade de liberdade e dispostos a abolir qualquer tipo de escravidão.

Então podemos concluir que Aracati não é só carnaval. É história cearense, educação e cultura e sim, é #BERÇO DE ABOLICIONISTAS CEARENSES.

Acredito que a população em geral tem conhecimento de que o mais famoso abolicionista das lutas no Ceará contra a escravidão é aracatiense: Francisco José do Nascimento, o “Chico da Matilde”, o Dragão do Mar. Este o mais destacado, no entanto, os destinos históricos convergiram para a “Terra dos Bons Ventos” importantes personalidades afamadas nacionalmente e que, em resumo, todos foram definitivamente abolicionistas.

Não tenho dúvidas, que foram abolicionistas – alguns mais famosos que tiveram ação de muita importância para o 25 de Março de 1884; outros à frente em outras competências culturais, artísticas e sociais, que igualmente são orgulho da terra. É fácil entender porque Aracati é o berço do abolicionismo cearense. Vamos aqui destacá-los seguindo a ordem cronológica de nascimento e vida dessas personagens:

Em 1814, no dia 29 de junho nascia em Aracati o jurista, jornalista e deputado federal pela Província do Ceará, Pedro Pereira da Silva Guimarães. É esse mesmo que dá nome a uma rua central de Fortaleza. Sabe o que ele fez, como deputado federal em um parlamento quase 100% escravocrata, ainda em 1850 e 1852?

Primeiro apresentou um projeto de Lei libertando todos os filhos de mulher escrava que nascessem a partir da data da lei. Isso em 1850, lembrando aqui que a Lei do Ventre Livre só veio mesmo a acontecer em 28 de setembro de 1871.

Imagine os ataques que ele recebeu em plenário e depois através da imprensa conservadora por ter apresentado “a louca proposta”. Não negando o sangue cearense abolicionista, em 1852, ele incendiou novamente a casa legislativa nacional com uma proposta considerada extremamente radical: Abolição da Escravidão.

Em 1814 também, em 06 de julho, outro aracatiense vem à luz, Eduardo Francisco Nogueira Angelim ou simplesmente Eduardo Angelim, um dos líderes da Cabanagem, no Pará, revolucionário e abolicionista que comandou a guerra por muitos anos no Norte do Brasil.

Em 1839, em 15 de abril, nascia Dragão do Mar, na mesma Aracati. Tinha 13 anos de idade quando Pedro Pereira manifestou-se contra a escravidão na Corte. Nesse período, Chico da Matilde já convivia com o tráfico negreiro no litoral cearense.

Em 1858, em 02 de fevereiro, nascia o jornalista, poeta e abolicionista Francisco de Paula Ney. Ainda jovem foi para o Rio de Janeiro onde se destacou nos movimentos culturais boêmios da cidade. Foi uma personalidade marcante na repercussão nacional e internacional das greves dos jangadeiros na Praia de Iracema. Responsável pela divulgação na imprensa carioca da resistência local contra o embarque de escravos.

Em 1867, em 29 de maio, nascia no berço abolicionista de Aracati, o escritor Adolfo Caminha. Romancista filiado à agremiação denominada de Padaria Espiritual, foi um abolicionista autêntico ainda muito jovem. Morreu no Rio de Janeiro onde foi morar com 13 anos de idade, em primeiro de janeiro de 1897. Apenas 30 anos.

Adolfo Caminha escreveu o romance “O Bom Crioulo”. Livro que conta a história de um marinheiro negro, antes escravo fujão, que se apaixona por um “grumete”, a menor graduação da força marítima, branco, louro e olhos claros. Com esse enredo, imagine a crítica e resistência da imprensa da época contra obra tida como violentamente despudorada, “sem vergonha”, que foi de encontro a todos os preconceitos da época.

Recebi, recentemente, do historiador Licínio Nunes de Miranda, pesquisador que vem se destacando mundialmente sobre o resgate da história abolicionista cearense, o seguinte texto: “Diploma de farmacêutico de meu trisavô, de 1863. João Jacinto de Sampaio (1836-1905) era natural do Aracati. Serviu na Guerra do Paraguai (1864-1870), e como major da Guarda Nacional do Icó, onde casou. Também foi juiz, vereador, e presidente da câmara municipal daquele município. Lá fundou a Associação Abolicionista Icoense, promotora da extinção da escravidão”. É outro abolicionista nato aracatiense, sem dúvida.

Icó, Ceará, foi o sexto ou sétimo município cearense a libertar seus escravos, ainda em 1883. O primeiro foi Redenção, ambos um ano antes do 25 de março, que neste ano completa 139 anos.
1930, em 10 de julho, nascia na cidade da alegria carnavalesca, Jacques Klein, filho de Alberto Klein, este último fundador do Conservatório de Música Alberto Nepomuceno, em Fortaleza. Família de judeus que se estabeleceu em Aracati, e que tem traços de qualidade na história global de resistência à opressão.

Aos 13 anos Jacques formou uma banda de jazz no Rio de Janeiro, onde a família foi morar, e se apresentava em auditórios de rádio. E posteriormente estudou em Nova Iorque e Viena.
Nosso famoso contemporâneo, Emiliano de Guimarães Queiroz, aracatiense, nasceu em primeiro de janeiro de 1936. Locutor, radioator, autor, diretor e roteirista, sem dúvida outro abolicionista da gema, de Aracati. Basta lembrar que, diante de inúmeras peças, novelas, filmes em que ele se destacou no Ceará, São Paulo e Rio de Janeiro, participou da minissérie da Rede Globo, em 1988, intitulada “Abolição”, escrita por Wilson Aguiar Filho, este, filho de um outro cearense famoso, mas de Massapé, Wilson Aguiar. Emiliano Queiroz também fez o roteiro – adaptação – da telenovela “Anastácia, a Mulher sem Destino”.

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