O papel da indústria farmacêutica na promoção da saúde no Brasil
Por *Sérgio Reiter
A indústria da saúde é uma das que mais investe em inovações no mundo e essa realidade também inclui o Brasil. Temos inúmeras empresas no país que utilizam tecnologia de ponta para a descoberta e o desenvolvimento de novos medicamentos, ações que impactam diretamente em melhorias nos diagnósticos e na prevenção de doenças.
O Brasil passa por uma transformação digital que se acelerou nos últimos anos devido à pandemia e tudo indica que ainda estamos no começo dessa evolução. O aumento do número de healthtechs brasileiras é um reflexo desse crescimento, a partir da diversificação das inovações voltadas aos cuidados com a saúde e o bem-estar das pessoas, mas esses benefícios precisam ser estendidos a uma parcela maior da população. O país ainda enfrenta muitas dificuldades em regularizações, por conta da rigidez nos requisitos de documentação, integridade dos dados e validação de processos. No entanto, os avanços no uso da tecnologia podem ajudar a mudar esse cenário de aceleração digital.
O futuro da saúde passa pela medicina 4P, uma abordagem baseada nos pilares da prevenção, predição, personalização e participação. É preciso sedimentar um caminho capaz de ajudar pesquisadores, profissionais da saúde e de outros setores a se conectarem, estabelecendo relações de colaboração mútua dentro de um sistema digital ágil e seguro.
Nesse caminho da saúde digital, a medicina 4P vai de encontro ao elo entre a indústria farmacêutica e as empresas de tecnologia em saúde. Trata-se de uma aliança estratégica que concede maior disponibilidade à indústria farmacêutica para focar na evolução do seu core business. Felizmente no Brasil já temos alguns casos em andamento deste tipo de parceria. Para citar um exemplo, um projeto intitulado Saúde da Mulher visa digitalizar a jornada de pacientes com câncer de mama. Por meio de uma plataforma digital é possível realizar agendamento de exames e consultas, teleatendimentos e monitoramento, acompanhante virtual, entre outras funcionalidades.
Essa linha de cuidados de ponta a ponta foi possível graças à parceria entre a indústria farmacêutica, uma empresa de tecnologia, e uma rede de hospitais filantrópicos o que possibilita o início do tratamento para câncer de mama em até 12 dias, tendo como base a transformação de protocolos de sobrevida em protocolos de cura, o aumento da abrangência do rastreamento e diagnóstico e tratamento precoce para câncer de mama. Tudo isso reduz o adoecimento e a mortalidade.
A tecnologia está mudando a experiência do paciente e a forma como os profissionais da saúde praticam suas funções. Na mesma linha da medicina 4P, o termo ‘Pharma 4.0’ também valoriza o uso inteligente das tecnologias como um forte aliado na transformação da saúde no Brasil. Apesar desse movimento estar em constante evolução, um dos grandes desafios que a indústria farmacêutica brasileira enfrenta é superar obstáculos para lançar novos medicamentos, especialmente para redução do time-to-market, ou seja, do tempo gasto com processos de produção até chegar às prateleiras. Além do tempo e dos altos custos de investimentos, uma série de etapas e exigências técnicas, éticas e regulatórias precisam ser cumpridas nesse processo, começando pelas fases de pesquisas pré-clínica e pelos estudos clínicos, seguidos dos registros nas agências de vigilância sanitária.
Mesmo após a permissão para serem comercializados, os medicamentos são monitorados e continuam em estágio de identificação e avaliação de possíveis efeitos adversos, através dos mecanismos de farmacovigilância, essenciais para garantir a eficácia dos medicamentos e a segurança da saúde dos pacientes. Nesse ponto, a burocracia e a falta de instrumentos tecnológicos eficazes contribuem para dificultar ainda mais os devidos processos.
As complexidades na regulamentação e a carência de procedimentos voltados principalmente à pesquisa e à promoção dos produtos medicamentosos contrastam com a rapidez evolutiva da tecnologia no setor. Neste cenário, as parcerias entre empresas de tecnologia e farmacêuticas impulsionam, por exemplo, o desenvolvimento de medicamentos especificamente desenvolvidos a grupos de pacientes, além de testes de diagnóstico que promovem tratamentos assertivos para cada doença.
Desafios para os próximos anos
O Brasil é o principal mercado de saúde da América Latina, com 9,1% do seu PIB direcionado ao setor e um notável sistema público, o SUS, que beneficia mais de 190 milhões de brasileiros. Temos no Brasil um nicho de mercado que ainda carece de investimentos e poderia dar um salto de qualidade no atendimento à população.
Existe um universo de entidades filantrópicas a serem exploradas pelas farmacêuticas, através de parcerias e utilização de plataformas digitais. Apesar de serem muito antigas, muitas dessas instituições estão ávidas por este tipo de relacionamento colaborativo baseado no uso de tecnologias integradas, uma vez que as Santas Casas e os hospitais filantrópicos respondem por 50% dos atendimentos do SUS, subindo para 70% em casos de alta complexidade.
Uma farmacêutica não é uma empresa de sistemas, essa é uma função que deve ser delegada a empresas de tecnologia com know-how em transformação digital. A indústria farmacêutica está cada vez mais integrada a AI, robótica, telemedicina e big data, com o objetivo principal de melhorar a experiência do paciente. Não à toa, a quantidade de healthtechs é cada vez maior. Estamos diante de uma grande oportunidade e as farmacêuticas que não se movimentarem nesse sentido vão ficar para trás.
*Sérgio Reiter é Diretor Executivo da Techtools Health