Com ‘pipoca virtual’, gringos participam de trios elétricos pela primeira vez
Cancelamento do Carnaval torna-se oportunidade de vivenciar a maior festa popular do mundo em patamar de igualdade
Neste sábado, 13, às aconteceu a live histórica em que, pela primeira vez, Claudia Leitte e Ivete Sangalo compartilharam o mesmo trio carnavalesco. Contudo, dessa vez não houve cordão, pipoca, camarote ou abadá. Todo mundo pode curtir a festa igualmente. Quem nunca vivenciou o carnaval, pode acompanhar tudo pela transmissão ao vivo do evento, que é um marco cultural, levando música, idioma e especificidades da linguagem brasileira para todo o mundo.
A bordo de “O Trio”, nome da live das cantoras baianas Ivete Sangalo e Claudia Leitte, a audiência potencial é muito mais diversa do que se estivessem cruzando a avenida. Essa experiência insubstituível não consegue sequer ser traduzida para a realidade digital. Em contrapartida, experimentar o Carnaval agora ganha contornos de expectativa coletiva em todo o mundo, graças à internet.
“A gente sabia que não ia acontecer um Carnaval na rua. A gente tem a responsabilidade de fazer os trabalhos dentro dos critérios de saúde, mas tem também que respeitar essa data”, disse Ivete Sangalo durante a coletiva de imprensa de apresentação do evento, no último dia 8. “Respeitar a data é respeitar a cultura nacional”, nas palavras da cantora que é um dos símbolos da folia tradicional nesta época do ano. “O desejo é de cantar a todos os foliões: seja aquele que acompanha todo Carnaval ou aquele que está precisando de um aconchego nesse momento. Toda vez que a gente sai com os blocos ou com o Pipoca, a ideia é promover uma festa sem interrupções. A dinâmica pela internet vai ser a mesma de quando estamos em cima de um trio elétrico: a festa não para. A transmissão é para todo o mundo”.
“O trio Elétrico já é uma invenção sensacional, que não tem em lugar nenhum no mundo. Um carnaval virtual é muito diferente, mas cantar é o nosso lugar. Estou sentindo muita falta do palco”, completou Claudia Leitte.
Estrangeiros enxergam a oportunidade de um Carnaval mais democrático
O desenvolvedor de TI britânico Chris Jones já esteve no Brasil algumas vezes, mas nunca para o Carnaval e está animado com a possibilidade de acompanhar a transmissão online e ao vivo. “Já estou empolgado para assistir essa experiência. Uma ação como essa é importante para manter tradições como o Carnaval vivas para que todos possam vivenciar essa festa”, afirma.
Para ele, a música é uma linguagem universal, completa, e para curtir a festa não é estritamente necessário entender as palavras que estão sendo ditas. “A maioria das linguagens podem ser entendidas quando você olha para o contexto em que estão inseridas. Por outro lado, o inglês é essencial, é o idioma do mundo, e com ele, a cultura brasileira pode atingir um número muito maior de pessoas”, afirma.
A linguista brasileira Camila Rocha Irmer, do aplicativo de idiomas Babbel, sediado em Berlim, explica que as manifestações culturais estão inseridas em um contexto linguístico. Nosso Carnaval traz à tona palavras como “afoxé”, “muvuca” e “cuíca”. Ou seja: a linguagem do principal evento do Brasil é constituída principalmente da herança linguística africana.
A especialista destaca que não basta uma tradução literal para que se estabeleça uma conexão entre as manifestações, mas também os contextos culturais dessas palavras. “E esse é o lado lindo das lives – agora pessoas do mundo inteiro poderão não só ter contato com letras e linguagem específicas, mas também ter acesso a todo o universo cultural que o idioma engloba”, afirma Camila. “Há mais de 10 anos nós elaboramos cada lição de português da Babbel levando em consideração não somente vocabulário e gramática, mas também contextos culturais – o que é imprescindível para a compreensão de uma língua, mas também de certa mentalidade”, completa.
Para o profissional de tecnologia norte americano Barry Beer, o Brasil e o Carnaval precisam encontrar um meio de se conectar aos estrangeiros de uma maneira mais eficiente. Segundo ele, as informações que chegam sobre nossa cultura em outros países são escassas, distorcidas e muitas vezes não confiáveis. “Nós temos interesse sobre o Carnaval brasileiro. Eu mesmo já estive no Brasil muitas vezes a trabalho, mas ainda tenho a vontade de me programar para poder acompanhar um Carnaval. E como não somos nativos do país, não entendemos muito o porquê de certas coisas. Por que a escola de samba escolheu aquelas cores para o desfile? O que está sendo cantado no enredo? Essas são dificuldades que temos em entender. Apenas a energia da festa e os ritmos não são suficientes para compreendermos a cultura por completo. Seria incrível se existisse um site onde após os desfiles que pudesse ter todo o material compilado em inglês para que todos os interessados, de todo o mundo, pudessem consultar”, comenta.
Ainda de acordo com o profissional, iniciativas como o longa animado “Rio”, da Disney, levam informações às crianças e o interesse em conhecer mais sobre a cultura brasileira. “Acredito que existe um mercado aberto para a cultura brasileira fora do Brasil. O brasileiro precisa conversar com esse público”, destaca”.
Para Camila da Babbel, está no momento dos brasileiros começarem a entender que falar outros idiomas também ajuda a valorizar a própria cultura brasileira. “Falar inglês ou qualquer outro idioma abre portas para nos conectarmos com o mundo e é a chave para que possamos mostrar nossa riqueza cultural para os demais países”, finaliza.