BRICS in Brasília – a 11ª cúpula do bloco

João Alfredo Lopes Nyegray

Em 1981, ao analisar o retorno de investimento para dez mercados de ações locais, o economista Antoine van Agtmael cunhou o termo “mercados emergentes” para se referir a economias atrativas que, no futuro, representariam um destino importante para investimentos variados. Vinte anos se passaram e, em 2001, o então economista chefe do Goldman Sachs, Jim O’Neill, criou o termo “BRIC” para se referir a quatro economias bastante promissoras: Brasil, Rússia, Índia e China. Mais tarde, foi acrescentado o “S” de South Africa (África do Sul), que se juntou ao grupo.

Ao que parece, Agtmael e O’Neill estavam certos: entre 2003 e 2007, os BRICS foram responsáveis por 65% do crescimento do PIB global. Em 2010, o PIB dos BRICS era cerca de 18% do PIB mundial. Atualmente, os 5 países representam 26% da superfície do planeta, 42% da população e 14% do Produto Interno Bruto Mundial. Ainda que cada uma das nações possua seus problemas a resolver e nós a desatar, são – sem dúvidas – países promissores.

De um lado dos BRICS, há a China e a Índia. Os chineses têm cerca de 1,4 bilhão de habitantes e uma força de trabalho que ultrapassa os 800 milhões de pessoas. Os indianos, por sua vez, são cerca de 1,2 bilhão e uma força de trabalho acima dos 500 milhões de habitantes. A China, como apontou Kissinger, foi o país mais rico do mundo em 18 dos últimos 20 séculos e, quando os atuais caracteres chineses surgiram, no segundo milênio antes de Cristo, “o antigo Egito se encontrava no auge de sua glória. As grandes cidades-Estado da Grécia clássica ainda não haviam surgido e Roma estava a um milênio de distância”. Esses dados nos mostram a profundidade e milenaridade da civilização chinesa.

Os indianos, também dotados de uma história milenar, tiveram um passado de colônia que acabou em 1948. Desde então, sua população cresceu e sua economia tem prosperado pelo menos 6% ao ano, graças aos investimentos em transporte e tecnologia. Enquanto o atual desafio da China é manter suas altas taxas de crescimento e evitar a desaceleração, o desafio dos indianos é retirar da miséria cerca de 40% de sua população.

Ao norte da Índia e da China está a Federação Russa, estado herdeiro da União Soviética, que conseguiu a proeza de aumentar sua classe média de 6 para 55 milhões de pessoas entre 2000 e 2008. Possuindo maior número proporcional de pessoas com diploma de nível superior do que os países europeus, os russos efetuaram uma reforma tributária que nós, brasileiros, tanto precisamos. Foi criado um imposto único com alíquota de 13%, o que tornou a Rússia o segundo ambiente tributário mais atrativo do mundo. O desafio russo está em superar a corrupção endêmica que caracteriza o ambiente de negócios do país. Além desse desafio, os russos precisam reaquecer a economia, que sofreu não apenas com uma recessão, mas também com as sanções econômicas aplicadas ao país de Putin, após a anexação da Criméia, em 2014.

Por fim, temos a África do Sul, cuja indústria química se destaca. O setor de serviços atende principalmente aos turistas que visitam o país, e a infraestrutura sul-africana é de nos fazer inveja. O nó sul-africano é o desemprego, o desaquecimento econômico e a miséria. Cada um dos BRICS com seus problemas.

E o Brasil nesse cenário? Bem, temos na China nosso maior cliente: enviamos produtos primários e recebemos manufaturados. Não poderia ser diferente, uma vez que a alta força de trabalho chinesa é uma vantagem, assim como as zonas especiais de exportação daquele país, que auxiliam a internacionalização de suas empresas. Para a Índia, exportamos principalmente óleo bruto de petróleo, óleo de soja e açúcar; e recebemos de lá químicos, inseticidas, medicamentos e alguns manufaturados. Em relação à Rússia, o Brasil envia soja e carnes, e recebe fertilizantes e tecnologias petrolíferas. Para a África do Sul, enviamos tratores e carnes e recebemos alumínio e outros minérios.

Na agenda desse encontro dos BRICS estão as questões da Venezuela e da Bolívia, os protestos em Hong Kong, as tensões na Caxemira e o futuro do bloco. As reuniões bilaterais são importantes não só para um melhor relacionamento diplomático, mas também para um melhor relacionamento comercial: chineses e indianos, por exemplo, têm recursos para investir aqui, em especial em nossa infraestrutura – que fica em último lugar no quesito portos e aeroportos. Outro desafio para o Brasil é criar condições para a melhor exportação de seus manufaturados, o que a China fez na década de 1980.

Muitos produtos industrializados chineses circulam o mundo, e nós temos grande dificuldade em fazer o mesmo. Enquanto na China o governo estimula as exportações com uma legislação pouco burocrática, o Brasil tem mais de 3.600 regras aduaneiras. Enquanto os brasileiros trabalham cerca de 2.500 horas por ano para pagar tributos, na China são cerca de 240.

Além das lições que o Brasil pode extrair de todos esses dados, um desafio conjunto é o de retomar o protagonismo global do bloco. Com as retrações econômicas do Brasil, da Rússia e da África do Sul, outros acrônimos surgiram. O próprio Jim O’Neill chegou a apostar suas fichas no que chamou de bloco MINT, composto por México, Nigéria, Indonésia e Turquia. Há, também outro ponto que merece destaque: enquanto Bolsonaro é alinhado aos EUA e a Donald Trump, Vladimir Putin é sua antítese.

Ainda com essa aparente contradição, devemos aproveitar a cúpula realizada em nosso país não apenas para assinar acordos pontuais, mas para semear futuros tratados que abram China, Índia, Rússia e África do Sul a nossos produtos. O negócio é fazer negócio, taokey?

 

*João Alfredo Lopes Nyegray, doutorando em estratégia, mestre em internacionalização. Advogado, formado em Relações Internacionais e especialista em Negócios Internacionais. Professor de Relações Internacionais, Comércio Exterior, Administração e Economia na Universidade Positivo.

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