B20 defende modernização de políticas de capital regulatório e de regras de classificação de risco para financiamento climático
Eventos climáticos extremos poderão onerar economias em desenvolvimento em até US$ 2 trilhões até 2050. Para atingir meta sustentável da ONU, países precisam investir U$$ 1,5 tri anualmente
Na semana em que ocorre a Climate Week em Nova York, nos Estados Unidos, de 22 a 29 de setembro, as atenções do mundo se voltam às ações para mitigação de eventos climáticos extremos. Uma das forças-tarefas do B20, braço empresarial do G20, tem contribuições relevantes a respeito. A principal é discutir o papel do financiamento do desenvolvimento do setor público e propor a reforma das políticas de capital regulatório e de agências de classificação de risco, para direcionar o fluxo de capital privado a programas climáticos, especialmente em economias emergentes.
O B20 defende a mobilização de capital privado em larga escala para subsidiar ações climáticas e apoiar a transição para uma economia de baixo carbono, fomentando o desenvolvimento sustentável.
O tema foi discutido nos últimos meses pela força-tarefa de Finanças e Infraestrutura do B20 Brasil, formada por CEOs de países do G20 e coordenada pela sócia-fundadora da eB Capital, Luciana Ribeiro. O grupo também apresentou propostas para acelerar a aprovação de projetos de infraestrutura resiliente e sustentável e fortalecer a integração de micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) às cadeias globais de valor (CGVs), estimulando o desenvolvimento sustentável, a renda e a inclusão de cidadãos aos sistemas financeiros e a cadeias produtivas.
As sugestões foram entregues ao G20 Brasil, presidido pelo governo brasileiro, em um Communiqué – que reúne 24 recomendações e ações de políticas para diferentes eixos. A entrega antecipada foi feita para sensibilizar a liderança do G20 antes da reunião do grupo, que acontece em novembro, no Rio de Janeiro (RJ).
Crises globais e efeitos da política monetária impactam economia
A força-tarefa de Finanças e Infraestrutura é uma das mais transversais. Eventos climáticos, crises globais, pandemias, e questões como diversidade e inclusão, desempenho em educação e trabalho, além da transformação tecnológica, desafiam gestores a criar políticas financeiras inclusivas e planejamento de curto, médio e longo prazos para promover o desenvolvimento sustentável.
Além de crises globais – como a pandemia de Covid-19 – e os conflitos geopolíticos, leva-se em conta os efeitos das políticas monetárias nos principais países desenvolvidos, que aumentam a vulnerabilidade da dívida para economias em desenvolvimento e reduzem a capacidade financeira desses países exatamente quando mais carecem de uma política de atração de investimentos.
Para se ter uma ideia dos impactos, eventos climáticos extremos poderão onerar países em desenvolvimento em US$ 400 bilhões até 2030 e US$ 2 trilhões até 2050, segundo o Adaptation Gap Report 2023. O mercado global de finanças sustentáveis é estimado em US$ 5,8 trilhões e os Sovereign Wealth Funds (SWFs), os fundos soberanos, controlam quase US$ 12 trilhões em ativos e comprometeram menos de US$ 10 bilhões a iniciativas relacionadas ao clima. Isso porque enfrentam obstáculos significativos para investir em tais projetos devido aos elevados riscos e aos ambientes regulatórios exigentes.
É preciso investir em economias de baixo carbono, desenvolvimento e industrialização
O contexto atual reforça a necessidade de promover economias de baixo carbono e investir em desenvolvimento e industrialização. Enquanto os países precisam investir U$$ 1,5 trilhão por ano para atingir os objetivos de desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU), de acordo com o Banco Mundial, 675 milhões de pessoas no mundo não têm acesso à eletricidade e 4 bilhões são excluídas digitalmente, especialmente nos países em desenvolvimento.
A ambição de triplicar a capacidade global de energias renováveis até 2030 significa atingir 11 TW de capacidade instalada, e alcançar essa meta exigiria energias renováveis construídas a uma taxa composta de crescimento anual de 14,9% até 2030.
A força-tarefa do B20 é fundamental nesse processo de discussão e sensibilização dos líderes mundiais. Os países do B20 concentram atualmente 60% da população mundial e são responsáveis por 75% das trocas comerciais globais, segundo levantamento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD).
As discussões do setor empresarial confirmaram que entidades financeiras privadas estão prontas para colaborar com o setor público na mobilização de capital privado, promovendo o desenvolvimento sustentável e uma transição equitativa. Atualmente, a lacuna que aponta necessidades de adequação do financiamento, dos custos modelados e dos fluxos financeiros públicos internacionais para a adaptação nos países em desenvolvimento, é estimada entre U$S 194 trilhões/ano a U$S 336 trilhões/ano, com base nos fluxos financeiros de adaptação de 2021[3].
Segundo a chair da força-tarefa de Finanças e Infraestrutura e sócia-fundadora da eB Capital, Luciana Ribeiro, “as recomendações reiteram a necessidade de as organizações multilaterais trazerem instrumentos que reduzam o risco país e incentivem o capital privado majoritariamente no Sul Global”. Nesse contexto, “o avanço da transição para uma economia verde e o acesso ao crédito de pequenas e médias empresas são vitais para geração de emprego e sustentabilidade econômica”, pontua Luciana.
Confira as três recomendações da força-tarefa de Finanças e Infraestrutura do B20 Brasil:
>> Recomendação 1: acelerar a implantação de capital privado para facilitar a transição para uma economia sustentável de baixo carbono
O B20 e o G20 devem, em conjunto, desempenhar um papel crítico na condução da narrativa de que o foco no investimento climático é um catalisador para acelerar a implantação de capital privado em escala em setores-chave, facilitando a transição para uma economia sustentável de baixo carbono. Como forma de atrair capital privado onde o custo de capital ainda não atingiu as condições de mercado, recomendamos: a) revisar o papel do financiamento do setor público para desenvolvimento (MDBs, DFI e ODA); b) abordar as políticas de capital regulatório e das agências classificadoras de risco para o financiamento climático, com foco nas condições necessárias para aumentar substancialmente a mobilização dos fluxos de capital do setor privado para investimentos climáticos que apoiem o crescimento sustentável de longo prazo e uma transição justa nos mercados emergentes e nas economias em desenvolvimento (EMDEs), até 2030.
Motivação: de acordo com a COP28 e o Climate Policy Initiative, para que os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) sejam atingidos em relação a metas climáticas, será necessário um investimento anual de 5 a 8,5 bilhões de dólares, até 2030.
Proposta de ação política 1.1:
Revisar o papel do financiamento de desenvolvimento do setor público (MDBs, DFIs e ODA) para melhorar sua eficiência de alocação de capital para o financiamento climático, tornando como objetivo central a mobilização de capital privado para destravar investimentos do setor privado em escala. O foco para essas instituições deve mudar da utilização da capacidade financeira de seu balanço patrimonial para alavancar seus recursos e experiência local para atrair capital do setor privado na fase inicial de diligência e financiamento do projeto, bem como ao longo das fases subsequentes do ciclo de vida do projeto (pós-financiamento).
Proposta de ação política 1.2:
Aumentar o investimento de capital privado em soluções climáticas em EMDEs através de reformas do capital regulatório e das políticas das agências classificadoras de risco para ajudar a alcançar um tratamento consistente de transações entre diferentes jurisdições, e o reconhecimento das características de mitigação de riscos de blended finance e estratégias de redução de risco, viabilizando assim um aumento das metas de alocação de capital para o financiamento climático em EMDEs.
>> Recomendação 2: aumentar o pipeline de projetos financiáveis e aprovados acelerando os processos de licenciamento para infraestrutura
Aumentar o pipeline de projetos financiáveis e aprovados acelerando os processos de licenciamento para infraestrutura que apoiem a transição net-zero e sejam resiliente ao clima.
Motivação: a necessidade de investimentos em infraestrutura é um desafio que impede o crescimento econômico e o desenvolvimento sustentável, especialmente no apoio à transição a uma economia livre de carbono e resiliente no que tange a questões climáticas. Segundo a OCDE, a lacuna de investimento em infraestrutura deve chegar a US$ 15 trilhões até 2040, um número impressionante que só aumentará se as necessidades, especialmente nos EMDEs, não forem atendidas adequadamente.
Proposta de ação política 2.1: cada país deve acelerar o processo de licenciamento de investimentos em infraestrutura que apoie a transição net-zero e seja resiliente ao clima, limitando os tempos máximos de licenciamento, criando um sistema integrado de licenciamento e estabelecendo processos ágeis (fast-track).
Proposta de ação política 2.2: os países devem promover a colaboração internacional para avançar a interoperabilidade e agilizar os procedimentos de licenciamento.
>> Recomendação 3: fortalecer a integração de micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) em cadeias globais de valor (GVCs)
Fortalecer a integração de MPMEs em cadeias globais de valor por meio de maior inclusão financeira e apoio regulatório.
Motivação: segundo o Banco Mundial, as MPMEs compreendem cerca de 90% das empresas e empregam mais da metade da força de trabalho global. Elas são particularmente importantes nos mercados emergentes, contribuindo com até 40% do PIB e 75% dos empregos formais.
Proposta de ação política 3.1:
Simplificar processos administrativos para integração global, aumentando a interoperabilidade entre fronteiras e rever a estrutura regulatória que impacta o acesso das MPMEs ao comércio e financiamento climático.
Proposta de ação política 3.2:
Viabilizar “ecossistemas de GVC”, melhorando a produtividade financeira de todas as empresas, especialmente MPMEs, e o acesso ao financiamento e à gestão do capital de giro.
Todas as recomendações e ações de políticas públicas do B20 Brasil podem ser lidas no Communiqué, na íntegra: https://b20brasil.org. As propostas do B20 também serão debatidas durante o B20 Summit Brasil, nos dias 24 e 25 de outubro, em São Paulo.
O B20 Brasil
O B20 (Business 20, da sigla em inglês) é o braço empresarial do G20 no Brasil, coordenado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Este é o principal fórum de diálogo mundial que conecta a comunidade empresarial aos governos do G20, mobilizando mais de 1,2 mil representantes do setor privado dos países membros.
A edição brasileira reúne sete forças-tarefas e um conselho de ação. Os grupos de trabalho são formados por empresários do Brasil e dos outros países, membros do G20, que estão debatendo, desde o início do ano, propostas de temas urgente e importantes, como: Comércio e Investimento, Finanças e Infraestrutura, Emprego e Educação, Transição Energética e Clima, Transformação Digital, Integridade e Compliance, Sistemas Alimentares Sustentáveis e Agricultura, além do Conselho de ação Mulheres, Diversidade e Inclusão em Negócios.