Até onde chega o impacto da produção in vitro de embriões bovinos
Alessandra Corallo Nicacio
Pesquisadora em Reprodução Animal da Embrapa Gado de Corte
Provavelmente você já ouviu falar sobre produção in vitro de embriões. Mas você sabe o que é e como ela pode ser utilizada a favor da produção animal? Então, é sobre isso nossa abordagem.
Produzir um embrião in vitro envolve algumas etapas e processos. Para começar é preciso coletar óvulos de uma fêmea (que vamos chamar de doadora), os quais passarão por um processo chamado maturação in vitro para que possam ser fecundados. Depois, utiliza-se sêmen de um touro previamente escolhido. Esse sêmen pode ser congelado, fresco, resfriado, sexado, tanto faz. O sêmen também é tratado para selecionar somente espermatozoides viáveis. Então, óvulos e espermatozoides são incubados para que ocorra a fecundação. E, depois da fecundação, os presumíveis zigotos são incubados (ou cultivados) para o desenvolvimento inicial dos embriões. Todos esses processos de maturação, fecundação e cultivo acontecem em placas de cultivo celular, com meios de cultura específicos para cada etapa, dentro de estufas próprias para o cultivo e desenvolvimento celular, com temperatura, umidade e atmosfera controladas. Ao todo, o processo demora cerca de dez dias e, então, os embriões podem ser transferidos para vacas (que vamos chamar receptoras) que irão gestar e parir os futuros bezerros.
Essa é uma explicação bastante simplificada de todo o processo, apenas para mostrar que é um procedimento bastante elaborado, que requer habilidades, conhecimentos, equipamentos e muita capacitação técnica para ser realizado. Muitas pesquisas científicas foram e continuam sendo feitas para aprimorar cada uma dessas etapas. Afinal, cada detalhe, cada reagente, cada célula envolvida no processo é importante.
Mas agora que falamos sobre o processo, precisamos comentar sobre sua finalidade. O objetivo de usar uma tecnologia como a produção in vitro de embriões não é apenas produzir mais embriões em menor tempo. Mais que isso, o que se pretende é produzir embriões de melhor potencial genético, a partir de óvulos e espermatozoides de animais de genética avaliada e selecionada, em maior quantidade e menos tempo. A ideia é utilizar doadoras e touros selecionados segundo critérios do melhoramento genético, para que os embriões produzidos tenham potencial genético melhorador, a fim de que o rebanho receba, a cada transferência de embriões, mais material genético selecionado.
E nesse momento é importante comentar o papel que cada animal tem nesse processo todo. O conceito de maximizar o uso de material genético de alguns indivíduos previamente avaliados é bastante difundido e entendido quando o assunto é o touro. Afinal, o impacto do reprodutor no rebanho é bastante conhecido, mesmo para quem trabalha em sistema de monta natural. Afinal, a relação touro:vaca é um conceito que todo produtor rural conhece bem. Quantos touros são necessários para cobrir o número de fêmeas em idade reprodutiva é uma informação que produtor e técnico têm na ponta da língua. E com isso fica claro o impacto que o touro tem no rebanho e na produtividade, a importância de adquirir touros saudáveis, com exame andrológico válido e, se possível, com avaliação genética.
Mas, quando se trabalha com monta natural o impacto individual de cada fêmea na composição genética e produtividade do rebanho é pequeno. Com o advento das tecnologias de produção de embriões, esse quadro se modifica um pouco. A fêmea passa a produzir mais filhos em um período de tempo menor o que aumenta sua importância individual na composição genética do rebanho. Ao invés de produzir um bezerro por ano como na monta natural, a vaca passa a poder produzir um bezerro por semana pela produção in vitro de embriões, podendo causar um impacto bem maior na composição genética do rebanho. Além disso, a cada semana é possível fazer diferentes acasalamentos com cada fêmea doadora, gerando embriões com variação genética, permitindo a produção de mais indivíduos contemporâneos que poderão ser avaliados quanto ao desempenho, com maior pressão na seleção sobre esses animais. Tudo isso, permite maior velocidade à seleção e melhoramento genético, com incremento visível na qualidade do rebanho. E esse incremento na qualidade do rebanho é percebido no aumento de produtividade.
Mas essa melhora não fica restrita aos rebanhos elite. Pois esses rebanhos elite produzem e vendem genética. São desses rebanhos que saem os touros que vão para as centrais de inseminação, que serão usados como reprodutores em inúmeras fazendas que usam a inseminação artificial. E aqui, já falamos em rebanhos comerciais, que utilizam a inseminação artificial para produzir animais para terminação e comercialização. E muitas dessas fazendas comerciais também vendem reprodutores para as fazendas que utilizam apenas a monta natural. Então, o fluxo dessa genética melhorada naqueles rebanhos elite que usam mais tecnologia chega a todos os produtores, mesmo o pequeno produtor, que pode ter acesso a touros melhores para a monta natural. Então, por mais que a produção in vitro de embriões pareça algo muito distante da sua realidade, tenha certeza, que ela não está tão longe assim!