Após 20 anos, governo anuncia Plano Safra 2019/2010 unificado, não reconhecendo o protagonismo da agricultura familiar
Ao longo das duas últimas décadas, os governos e o Congresso Nacional reconheceram o protagonismo e as especificidades da agricultura familiar brasileira ao criar leis, políticas e programas direcionados aos agricultores e agricultoras familiares, a exemplo da Lei 11.326/2006, também conhecida pelo Lei da Agricultura Familiar, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), a criação de um Ministério específico – o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), entre outras. “Ainda no governo de Michel Temer, o MDA foi extinto e o orçamento para a agricultura familiar sofreu corte drástico. Agora, no governo atual, optou-se por anúncio unificado do Plano Safra 2019/2020, com um slogan ‘Uma só agricultura alimentando o Brasil e o mundo’, desrespeitando todo um legado de avanços para a agricultura familiar, o setor que produz a maioria dos alimentos consumidos no País. Inclusive, a decisão de não realizar um anúncio específico para a agricultura familiar acontece justamente quando a Organização das Nações Unidas (ONU) reconhece o protagonismo da agricultura familiar ao declarar e, recentemente, lançar a Década da Agricultura Familiar e que, em breve, será lançada no Brasil”, questiona o secretário de Política Agrícola da CONTAG, Antoninho Rovaris.
Quanto ao anúncio, o dirigente da CONTAG disse que a novidade é o anúncio de R$ 500 milhões para construção ou reforma de moradias para agricultores(as) familiares. “Apesar de o valor ser insuficiente para a demanda apresentada pela CONTAG, que seria de R$ 3 bilhões, entendemos que será uma boa opção para alguns agricultores e agricultoras familiares de garantir uma moradia digna no meio rural brasileiro”, enfatiza o secretário de Política Agrícola da CONTAG. Essa linha destinará de R$ 10 mil a R$ 50 mil por agricultor(a) familiar para reforma ou construção de casa, a juros de 4,6%/ano, com 3 anos de carência e 10 anos para quitar a dívida. A Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil são os agentes financeiros credenciados para essa linha da habitação.
Um ponto positivo do anúncio é o que trata do Patrimônio de Afetação, que será permitido ao produtor desmembrar seu imóvel para oferecer como garantia nos financiamentos. Houve aumento também no montante para subvenção ao Seguro Rural, que passa a ser de R$ 1 bilhão; mas esse valor vai variar de acordo com a quantidade de apólices contratadas.
O valor de R$ 31,22 bilhões para crédito do Pronaf para a Safra 2019/2020 é praticamente o mesmo anunciado da Safra anterior. A CONTAG havia reivindicado R$ 33 bi, mas o montante divulgado já era esperado pela entidade.
No entanto, algumas questões deixaram a CONTAG insatisfeita, como o aumento de juros nos financiamentos. “É um aumento pequeno, porém não havia necessidade de aumentar para a agricultura familiar, principalmente num cenário de recessão no País”, avalia Rovaris.
Algumas linhas de financiamento do Pronaf não apareceram na apresentação, a exemplo do Pronaf B, Pronaf Mulher, Pronaf Jovem, Pronaf Agroecologia, Pronaf Produtivo Orientado (PPO), entre outras. O governo cita, apenas, o montante de recursos de custeio para produção de alimentos básicos, como arroz, feijão, mandioca, trigo, leite frutas e hortaliças; e, para investimento, para recuperação de áreas degradadas, cultivo protegido, armazenagem, tanques de resfriamento de leite, energia renovável e outros. “Outra preocupação é que, em nenhum momento, foi apresentado valor destinado a assistência técnica para a agricultura familiar e nem para os programas de compras governamentais”, destaca Rovaris.
Quanto à equalização, o dirigente da CONTAG avalia que, proporcionalmente, os grandes produtores foram beneficiados em relação aos outros segmentos. “Como o governo também irá subsidiar os juros dos grandes proprietários, proporcionalmente o valor destinado para a equalização das dívidas desse público será maior em relação à agricultura familiar e para os médios produtores”, explica.