Exportar dietas saudáveis

Elisio Contini[1]

Pedro Abel[2]

Dieta saudável ou de alta qualidade inclui uma diversidade de alimentos seguros, com níveis adequados de energia e de micronutrientes, essenciais, de acordo com  idade, sexo e atividade física, diz o estudo do Painel Global sobre Agricultura e Sistemas Alimentares para a Nutrição (Glopan em inglês, instituição com sede em Londres), publicado em fevereiro de 2020 sob a forma do artigo “Repensando Políticas de Comércio para apoiar Dietas Saudáveis” [3]. A Organização Mundial da Saúde (OMS) enfatiza que uma dieta saudável deve contemplar a ingestão de frutas, vegetais, grãos naturais, fibras, castanhas e sementes, limitando o açúcar, snacks, refrigerantes, carnes processadas e sal, além de substituir gorduras trans por gordura não saturada.

A tese principal do documento é um apelo aos formuladores de políticas que incluam nos instrumentos de comércio ações que restrinjam o comércio de dietas não saudáveis e promovam as dietas de alta qualidade. Dentre os múltiplos aspectos tratados, chama a atenção uma comparação, elaborada pela Universidade de Harvard, entre o que se produz no mundo e um modelo de dieta saudável. Ainda que a proposta deva ser considerada com cautela (os totais não fecham em 100%), há diferenças enormes entre o que é disponibilizado para consumo humano e a proposta de Harvard. A Tabela 1 retrata estas diferenças, algumas gritantes.

Duas premissas orientam esta discussão: (i) o consumo mundial de alimentos vai orientar-se, a médio e longo prazos, para uma dieta mais condizente com padrões de boa nutrição e de promoção da saúde do que o consumo atual; b) o principal pilar de crescimento da produção do Agro Brasileiro reside nas exportações. A criação de Adidos Agrícolas nas Embaixadas Brasileiras e da Secretaria de Relações Internacionais no Ministério da Agricultura, durante a administração do ex-Ministro Roberto Rodrigues, foi o reforço institucional para ampliar as exportações do Agro Brasileiro.

Tabela 1: Comparação entre Dieta Saudável (Modelo Harvard) e produção mundial (em %)

Produtos Produção de alimentos – FAO 2011 Modelo Dieta Harvard
Cereais e Tubérculos 47% 20%
Frutas e Legumes 11% 49%
Açúcar 16% <5% (OMS)
Leite e Derivados 4% 8%
Feijão, Carnes, Peixes, Ovos 11% 20%
Óleos, Gorduras 11% 3%

Fonte: Global Panel, 2020, com base em publicação da FAO.

Que recomendações, de médio e longo prazos e que sirvam de subsídios para os formuladores de políticas de exportações e para investimentos do setor privado, podem ser extraídas da Tabela 1? Vejamos:

  1. Cereais e tubérculos. Seu consumo no mundo é excessivo e está muito longe da proposta de dieta saudável, segundo o modelo de Harvard. Este fato deve ser influenciado fortemente pela produção e consumo de arroz na Ásia. A longo prazo, e sob a hipótese de que o mundo venha a adotar uma dieta mais saudável, não seria recomendável priorizar cereais e tubérculos nas exportações, não ser o  milho que compoe a alimentação animal, A recente conquista para o mercado de milho é um favor importante das exportações brasileiras e deve avançar para os próximos anos.
  2. Frutas e Legumes. O consumo de frutas e legumes, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, pelo nível de produção, era de apenas 11%  do total produzido no mundo. O modelo de Harvard de uma dieta saudável propõe elevar o nível de consumo para 49%. Esta é a grande avenida de trabalho para liberar exportações por parte de agências governamentais e negociações do setor privado. Aliás, o ex-Ministro Pratini de Moraes, no início deste século, estabelecera duas prioridades para exportações: carnes e frutas. Deve-se reconhecer o sucesso atual no mundo das carnes e frutas, destacando que ainda há muito a fazer em frutas que ainda não atingiu US$ 1 bilhão de exportações.
  3. Açúcar. Em relação ao açúcar em que o Brasil detém grande parte do comércio internacional, não se trata de abandonar o que foi conquistado, mantendo a competitividade imbatível do País. A estratégia consiste em manter a hegemonia no setor, mas atentos a possíveis mudanças importantes no consumo mundial.
  4. Agrupamento feijão, carnes, peixes e ovos. Embora pressões internacionais para diminuição do consumo de carnes vermelhas, ainda há espaço para o crescimento no consumo de carnes no mundo. E o Brasil pode aproveitar deste megamercado mundial. É difícil entender a não participação do Brasil no mercado mundial carne de peixes, considerando a ampla costa brasileira e o potencial de água no interior do Brasil. Há falta de organização no setor?
  5. Óleos e Gorduras. O modelo de Harvard propõe um corte no consumo de 11% para 3%. Parte da soja está incluída nesta categoria, mas ela é mais importante como fonte de proteína vegetal e na ração animal. Dados recentes mostram que a soja deve se manter firme no mercado internacional, o Brasil consolidando a liderança.

Mensagem ao Agro Brasileiro:

Na medida em que a renda mundial aumenta e a consciência sobre a necessidade de melhorar a alimentação – mais orientada para a boa nutrição e a saúde- assume maior valor a hipótese de que as dietas orientar-se-ão para produtos mais saudáveis. Não somente a produção para o consumo dos brasileiros, mas também as exportações do Agro Brasileiro do futuro necessariamente seguirão este caminho.

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